Hudson Mohawke Está Exatamente Onde Queria Estar

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Música

Hudson Mohawke Está Exatamente Onde Queria Estar

O produtor escocês falou sobre os lances que o levaram até seu novo álbum, ‘Lantern’.

A história do Ross Birchard está se tornando familiar. O jovem produtor de Glasgow, na Escócia, saiu de uma cena e entrou em outra de forma perspicaz, deixando o Sub Club de lado para trabalhar com artistas como Kanye West, Drake e Pusha T. Sua agenda telefônica deve ter os mesmos nomes que bombam numa rádio de hip hop. No entanto, os artistas que fizeram colaborações no seu segundo álbum solo Lantern são diferentes, consideravelmente menos conhecidos. "Não é como se pessoas que estão neste disco sejam menos fantásticas, mas não são nomes que distraem do álbum. Se eu tivesse um graaande artista nesse trabalho, acabaria ofuscando todo o resto. Este é um disco do Hudson Mohawke".

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Me mandaram o Lantern poucas semanas antes da nossa entrevista e posso dizer que é um disco estranho. Estranho no bom sentido. No melhor sentido possível, aliás. Excepcionalmente estranho. Singular e brilhantemente estranho. Ele rapidamente se tornou uma criança hiperativa que foi libertada na biblioteca do meu iTunes - abrasivo, rebelde, e impossível de ser deixado sozinho. Ouvi o disco com uns amigos antes de sair e depois ouvi de novo quando estava com insônia.

O trabalho mais antigo do Birchard e seus contemporâneos, incluindo o Rustie, cimentou o caminho para o affair da música eletrônica atual com o pop e o hip hop, encharcado de maximalismo e quedas de alta octanagem. No entanto, hoje vivemos no mundo da PC Music - o excesso ultra brilhante é revestido com camadas de ironia, nos protegendo da vulnerabilidade presente na honestidade emocional. O Lantern se recusa a seguir essas regras, derramando sua dose de meta-dinâmica em favor do otimismo explosivo e direto. O disco, assim como seu criador, é uma anomalia feliz.

Em busca da felicidade, o rapaz de 29 anos sentou-se na minha frente em um restaurante consideravelmente vazio e me garantiu que o seu interesse em aproveitar a euforia não vem de hoje. "É algo que eu sempre curti, por ser um fã genuíno de happy hardcore de um jeito nada irônico. Eu ouvia esse tipo de música a sério sem fazer a menor ideia do contexto ou da cena".

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A partir dessas primeiras influências, o desejo de Birchard de capturar algo alegre e cheio de vida perdurou, sobrevivendo ao tempo de sua ascensão meteórica. O jovem produtor escocês teve alguns anos repletos de encontros e projetos significativos. Esta transição e tanto, eu ponderei, deve ter alterado bruscamente sua perspectiva em relação a quase tudo. "Tudo o que passei me fez ter mais noção do que falar e não falar em entrevistas", Birchard me disse, seus olhos desaparecendo por atrás de um grande sorriso.

Grande parte dessa ascensão ocorreu graças ao TNGHT, sua dupla super-trap com o produtor canadense Lunice. Junto com seu EP autointitulado veio uma escalada perturbadora, turnês constantes e uma onda de interesse por parte dos fodões da insdústria. "Estávamos recebendo propostas de labels americanas gigantescas, que falavam tipo, 'toma aqui essa puta grana e vai fazer um disco'. Sinto como se pudéssemos fazer isso a qualquer momento. Teria sido ótimo por talvez um ano, mas depois tudo teria ido pro saco". Para uma voz tão diferente quanto a do Birchard, as chances de ele ser engolido por uma proposta que venderia milhares de discos como uma máquina de hits é chocante. "Poderíamos ter feito um disco inteiro do TNGHT, mas qualquer coisa solo que lançássemos depois disso seria acompanhado de um TNGHT entre parênteses".

"Quando ainda estava adentrando esse universo, surgiram várias oportunidades, e eu estava tipo, 'porra, eu tô exausto', mas elas pareciam boas demais para serem recusadas. Tive que começar a priorizar, percebi que não podia simplesmente dizer sim para tudo porque tinha medo de não ter uma oportunidade daquelas novamente". O turbilhão de interesse inesperado na sua produção submeteu o Birchard a um processo de compromissos impossíveis e agendas ainda mais impossíveis. "Eventualmente fiquei tipo, 'Preciso começar a dizer não ou não vou conseguir fazer um disco novo. E aí o Hudson Mohawke já era'".

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Falamos um pouco sobre a sensação de "queimar a largada" que esse período de tempo intenso induziu. Meses de shows intercalados com produções regulares para outros artistas - o tempo todo "fazendo turnês com uma galera que só queria transar o tempo todo" - culminou em um estilo de vida insustentável. Birchard foi cauteloso para que não perdêssemos muito tempo falando sobre essa época, entretanto longe de se sentir vigiado ou com vergonha, ele parece achar isso tudo irrelevante. Quando ele começa a se sentir trashy, peço desculpas e lhe dou certeza de que não estou focado em histórias para abastecer os fofoqueiros de plantão. Ele dá de ombros e sorri novamente: "Essas coisas acontecem, mas não sinto a necessidade de falar sobre elas".

As coisas realmente acontecem, mas fiquei surpreso como o Birchard deixou a barrinha dessas "coisas" tão alta. Ele fala sobre uma vida de trabalho itinerante por trás das portas onde está a elite responsável pela música mais lucrativa, pra frentex e popular do nosso tempo. "Essas coisas acontecem", ao meu ver, seria o melhor jeito de descrever as minúcias mundanas; a bateria do meu celular acabando ao longo de uma noitada, uma quantidade excessiva de ketchup, peidar no busão. Mas talvez isso diga bastante sobre os poucos anos que fizeram o Birchard emergir, um período de sucesso saturado. Uma jornada tão intensa que acabou se tornando uma bagunça de "coisas" exaustiva porém definidora.

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Se o Lantern é o resultado do desfoque, então ele certamente prova a teoria de que demonstrações de alegria precisam de uma pitada de escuridão para serem colocadas para fora. "Este sou eu enquanto produtor, e não criador de beats. Estou expandindo em uma série de coisas que queria fazer durante anos. Fazer músicas de verdade ao invés de apenas um beat". Pergunto se, ao tentar fugir dos beats, ele está rejeitando as baladas como um todo. "Tem um motivo para termos lançado "Chimes" como um single. Obviamente quero fazer música de balada porque ser DJ é divertido, mas não é algo que quero colocar num álbum. Me distanciei de grandes formações e batidas óbvias".

Enquanto falávamos mais sobre o Lantern, Birchard ficava mais animado, expressando um entusiasmo pueril, como se alguém de quem ele é o maior fã tivesse lançado um disco. "Gosto muito da música com o Miguel, amo a ideia de colocar esse solo de guitarra ridículo no fim da música!". Seu orgulho não é arrogante e sim uma espécie de empolgação efervescente - é este personagem desenfreado que fundamenta o álbum. Desde a majestade brilhosa de "Kettles" até o hardcore gabba de "System" - uma faixa que o Birchard descreve como um "sintetizador TR-909 pesado do Jeff Mills depois de todo o R&B" - o disco é uma cristalização de influências, peculiaridades e experimentos que ele colecionou até então.

"Sinto como se várias pessoas só tenham tomado conhecimento de mim depois do material do TNGHT, então minha missão com esse disco é mostrar aos meus fãs o que eu realmente curto". E eles não vêem a hora - qualquer pessoa que espera músicas de balada arrebatadoras não se decepcionará tanto quanto ficará desnorteado, possivelmente até mesmo sobrecarregado.

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Depois de demonstrar sua perspectiva destorcida, Birchard fica nervoso quando levanto a questão sobre a arte do disco. "Originalmente, tínhamos outra ideia para a capa. Era para ser o meu pai, vestido de Ronald McDonald, escavando um túmulo. Mas acabou que o meu pai não estava disponível". Me pergunto qual significado eu deveria decifrar na imagem de um palhaço preparando um lugar de descanso final, mas decidi que os segredos por trás disso são, provavelmente, mais bem administrados pela imaginação fecunda e implacável de Birchard.

Os artistas que colaboraram no álbum também marcam uma progressão interessante para o produtor. Para o que é, sem dúvida, o lançamento solo de nível mais alto do Hudson Mohawke, os nomes que o acompanham são relativamente desconhecidos. Exceto pelo Antony Hegarty e Miguel, o álbum é pontuado com características de vocalistas que o Birchard se deparou e cultivou "relações pessoais", para evitar a "total encheção de saco" de ter que enviar pastas de música para o pessoal do "RH" da música.

Birchard parece confiante em relação a isso, centralizando-se como o personagem principal no disco - não apenas um elemento usado por um grande nome. Com isso veio uma confiança cautelosa. "Estou numa posição bem boa, mas quando você começa a dizer 'Estou exatamente onde queria estar', é o começo do fim. Se há algo que quero fazer, e consigo fazer, então estou numa espera constante do próximo passo".

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Já tendo notado uma referência ao seriado Curb Your Enthusiasm na bio do seu Twitter (a série é uma paixão nossa em comum), sugiro que talvez o Larry David seja alguém que está exatamente onde ele gostaria, e está confortável com esse sucesso. Birchard considera a comparação, "é, mas ele vale milhões - ele fez Seinfeld e agora pode seguir em frente com projetos pessoais!". E eu sugiro que talvez, só talvez, essas propostas de disco que foram feitas ao TNGHT e ele recusou podem ter sido o seu Seinfeld. Hudson Mohawke ri da minha cara.

Lantern será lançado no dia 16/06.

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Tradução: Stefania Cannone