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Música

Tive um jantar romântico com o Marilyn Manson

Eu comi sushi, ele enguia.

Quando o Marilyn Manson tinha 13 anos, costumava espiar o seu avô a masturbar-se. Mas será que isso explica o facto de ele apertar um espeto de churrasco contra a bochecha de uma gaja no vídeo da “Overneath the Path of Misery”, realizado pelo Shia LaBeouf? Talvez. O Manson é um campeão do grotesco, um tipo que gosta de provocar repulsa. O seu imaginário é nojento e confuso, mas nunca aborrecido. Não acho que o crédito de tudo isto possa ser, inteiramente, deixado nas mãos do bate-carne do avô. No cerne, Manson (aliás, Brian Hugh Warner, nascido a 5 de Janeiro de 1969) é um músico, um pintor e um compositor. É um gajo inteligente, que se move com feminilidade por entre o caos gótico. Adora próteses de membros e consegue gritar como se lhe estivessem a arrancar as mamas. Admira Salvador Dali, Willy Wonka, taxidermistas e absinto. No ano passado, o lançamento do seu oitavo disco, Born Villain, pela Cooking Vinyl, e da sua própria editora, Hell Etc., quebrou o seu breve hiato musical. Com o guitarrista Twiggy Ramirez a bordo, as canções voltaram à sonoridade industrial. Os gritos também estão de volta: Manson quer regressar às raízes. Ouvi alguém queixar-se de que este disco não traz nada de novo, mas queriam que o gajo começasse a cantar folk? Não. Queremo-lo como é, fodido, industrial, a comer pássaros e a fazer-nos tremer. O Marilyn Manson de 2013 é menos vil (o que é bom), mas ele ainda é um monarca anti-estado. Entrevistei-o ao jantar, pelo Skype. Ele comeu enguia. Eu comi sushi comprado no supermercado. O jantar dele parecia suculento. O meu era de plástico e sabia a lápis de cor. O Marilyn estava a beber uma bebida alaranjada e não me pareceu que tivesse acabado de comer um canário. Ah, e o gajo nem estava a usar a sua lente de contacto do terror. VICE: Vês beleza no grotesco?
Marilyn Manson: Quanto mais mórbida ou grotesca for uma coisa, ou quanto mais curiosidade essa coisa possa gerar, mais eu gosto. Um pensamento de nível animalesco, primário, sexual leva-me logo para as trevas. Os teus concertos são uma espécie de desfile cruel. Quando vejo os teus vídeos, há um imaginário ao qual acabas por não resistir. Por exemplo, todo o vídeo de “Overneath the Path of Misery”.
Se tens curiosidade é porque te atrai. Acho que isso é eficaz. Interessa-me que as pessoas fiquem coladas, curiosas com este lado mórbido, claro. Quanto mais grotesco, mais hipóteses tem de ser perfeito. Quanto mais grotesco, menos tem a esconder. Gostas de destruição?
Nem tanto. Nem da morte. Podem olhar para as coisas simbolicamente, claro. A última destruição é o quê? A morte, certo? A moda pode ser encarada como o derradeiro orgasmo, o clímax final. Também gosto de criar tensão: quanto maior for a tensão, melhor é o clímax. Algum do teu imaginário é feio, ou assustador. Mas cativante. Isso é confuso. Um horror bom.
Acho que essa confusão e esse caos são o que a arte deve ser. Não quero ter de explicar a minha arte. A arte é que deve explicar o artista. Se criares algo confuso, é algo que terás de questionar. Perguntarás: o que é que isto significa? Por que é que eles estão a fazer isso? Quando a arte consegue ser explicada facilmente, não acho que inspire as pessoas a ter pensamentos próprios. Acho que o papel do artista é questionar-se, não é responder a perguntas. Não gostaria de explicar o que faço, seja na música ou na pintura. Posso falar sobre o porquê de estar a fazer algo, mas se chegas a um ponto em que te defines por só uma coisa, estás confinado a essa caixa e corres o risco de te extinguires. Tenho uma questão. Como é que está a tua enguia?
Está fixe. E o teu sushi?

Sabe a fralda.
[O Manson estava a comer com imenso cuidado. Não se sujou nunca. A enguia dele, mesmo por Skype, parecia altamente, toda cheia de molho, à luz ténue da vela que o iluminava. Foi então que ele me contou um episódio estranho: uma vez estava na Turquia a jogar com berlindes feitos de testículos petrificados. Testículos humanos, de gente cujos corpos não foram reclamados na morgue.] Sabias que eram testículos de gente?
Pensei que estivessem a brincar comigo. É demasiado bizarro saber que alguém se diverte à custa das bolas de gente morta. É uma daquelas coisas grotescas e bonitas. Os testículos produzem esperma, o esperma é produzido por um orgasmo. Vencer aquele jogo de berlindes era como ter um orgasmo, de certa maneira. Atingir as bolas dos outros e atirá-las para fora do círculo de jogo, ganhar. Como o esperma é ejaculado para dentro da mulher, das trompas da mulher, encontra o ovo e vence todos os outros espermatozóides, fecundando o ovo. Vences a corrida, o jogo. Há varias camadas de interpretação aqui. Mas só joguei aquilo durante alguns minutos. Os outros jogadores eram fodidos dos cornos. Talvez não fossem mesmo testículos humanos, quem sabe? Pareciam-te testículos petrificados?
Não faço ideia. Qual é que é a sensação de segurar testículos petrificados? Boa pergunta.
Pá, sei lá. Até podiam ser simples bolas de plasticina. A tua versão da "Tainted Love" está fixe.
Obrigado. Soft Cell, grande banda. Decidiste gravar este álbum em Berlim. Porquê?
Foi onde nasceu o expressionismo. Representa aquilo com que eu me identifico quando penso em arte e no processo criativo, ir contra as pessoas que tentam atrasar a mudança, ter o controlo. E foi onde comecei a ser pintor, Berlim foi a primeira cidade a aceitar-me como tal. Também gosto muito de dar concertos por lá. Fiz o álbum em Berlim e senti-me inspirado, como se estivesse a gravar pela primeira vez na vida. Como assim?
Fui para um sítio e rodeei-me dos meus livros filmes, dos meus livros e de outras coisas minhas. Coisas que me pudessem inspirar. Tinha lá os meus pincéis e as minhas tintas. Os meus instrumentos, o meu equipamento de gravação, o microfone, as câmaras. Quis criar um lugar em que pudesse chamar os meus amigos para colaborarem comigo. Não havia relógios, era como se o mundo exterior se desvanecesse. Só queria criar. Criar, criar, criar. Tocas mais guitarra neste álbum.
A "Pistol Whipped" foi uma ideia que me veio a meio da noite. Estava sozinho, por isso arranjei maneira de a gravar sem ajuda. Não me considero um guitarrista, propriamente. Mas queria expressar o que me ia na cabeça. Tnha de tocá-lo.