Portugal gosta de recordes. Adora. Basta olhar para aquilo em que somos mais do que os outros, seja no futebol ou na maior feijoada em cima de uma ponte. Mas, há outro indicador sombrio que mancha o país de vergonha: Portugal é vice-líder europeu em mortalidade por causa do frio. Alexandra Carreira é Assistente Social e não tem de recuar muito para encontrar um exemplo de um caso dramático. Foi aqui há dias e o telefonema que recebeu era simples: "Ajudem-me. Estou a morrer!". Assim mesmo, sem meias palavras.
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Era uma situação já sinalizada. A casa da senhora que fez a ligação estava gelada, os seus níveis de oxigénio estavam preocupantemente baixos e deu imediatamente entrada numa IPSS, que, por sua vez, internamente, trava um outro combate. Tal como em muitas outras instituições, especialmente no Inverno, há uma luta dramática para conseguirem pagar as contas astronómicas de água, luz e gás.Aguardam-se novos dados lá mais para a Primavera, mas, desde a última vez que o Eurostat (autoridade estatística da União Europeia) olhou para esta questão e comparou os respectivos preços, em função do poder de compra, Portugal tem a electricidade e o gás natural mais caros da Europa. Isto é, sobretudo, fruto de dois factores muito simples: impostos e preço base ao consumidor.Quando dizem que Portugal tem um clima fantástico, não sendo mentira, a verdade é que também se morre de frio. E muito. Também é isso que o espanhol El País aponta, num artigo onde são reforçados alguns indicadores alarmantes. O jornal cita um estudo que coloca Portugal, apenas a seguir a Malta, como o país europeu onde mais se morre de frio.
O jornal espanhol cita ainda um outro estudo, este do Parlamento Europeu sobre a pobreza energética e diz que 23,8 por cento da população portuguesa não consegue manter a sua casa quente, enquanto que a média europeia anda nos 10 por cento. Todos os truques são bem-vindos para poupar energia e ser mais eficiente energeticamente, sem mandar dinheiro pelas frinchas das portas e janelas. Contudo, há um problema de fundo quando, simplesmente, não se consegue aquecer a casa onde se habita e não há dinheiro nem para obras, nem para pagar as contas.
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Enquanto isso, igualmente por cá, as grandes empresas energéticas portuguesas - EDP, REN e Galp - choram as pedras da calçada por causa da CESE (Contribuição Extraordinária sobre o Sector Energético). Aquilo é gente com dificuldades, sabem? No entanto, todos os consumidores continuam a pagar grandes rendas de electricidade e gás.Assim, aqui fica o dia-a-dia de alguma malta que lida com o frio e, embora não pertença a grupos de risco, também não tem propriamente um ordenado de um qualquer presidente de uma energética (sete mil euros por dia, vá…), que ainda é menino para se opor ao alargamento da tarifa social - a ser pago pelos lucros da empresa - destinado a pessoas mais carenciadas. A espuma dos dias à portuguesa.
Tânia, 39, stage manager, Lisboa
Sofia, 36, designer, Lisboa
Filipa, 34, barmaid, Leiria
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Rita, 35, técnica de turismo, Leiria
Joana, 40, realizadora de animação, Lisboa
Com as baixas temperaturas, como todos sabemos, os tomates encolhem. E, neste país másculo, temperado e ameno em dias bons, até houve quem tentasse fazer frente a este lobby energético, mas deu-se mal.A verdade é que, do outro lado, anda muita gente que tem apenas dois amendoins no meio das pernas. Deve ser do frio. Ou se calhar não.
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