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Música

Löis Lancaster brinca com os limites da canção em 'Malva'

O veterano do underground carioca se inspira em mitologia africana, David Bowie e Guimarães Rosa em novo disco, que sai pelo Sê-Lo!, de Salvador.

A canção sempre foi uma questão conflitante na trajetória musical de Löis Lancaster. Parte da banda carioca de rock (psicodélico? experimental? humorístico?) Zumbi do Mato, detentora de certo prestígio no underground do Rio de Janeiro, o originalmente baixista Luis Alencastro se aventura em carreira solo há quase uma década, mas comenta que o formato de banda, para ele, foi sempre intrínseco à rejeição da canção.

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"A banda trabalha mais no limite da canção; cada integrante faz uma coisa. E as pessoas sempre querem estabilizar, tirar essa coisa da polifonia das várias vozes", acrescenta, citando exemplo de bandas populares brasileiras que passaram por mudanças em seu lineup, como o Barão Vermelho e os Titãs. "É uma tendência meio acachapante de deixar tudo canção."

Seu novo trabalho, Malva, é lançado pelo Sê-Lo! Netlabel, nessa segunda (7), como um disco solo, mas nem por isso o Löis perde a relação complexa entre a canção e não-canção que caracteriza seu trabalho. "Desde início, como sou baixista, meu instrumento é melódico, então nunca foi muito a minha fazer músicas com blocos de acorde e linha melódica só de voz, que é o que normalmente a música popular faz. Eu sempre procurei algo mais contrapontístico do que propriamente canção."

As referências de Löis são muitas e permeiam as oito faixas (duas bônus) do álbum: Diamond Dogs do David Bowie ("essa coisa da distopia, da celebração midiática que a gente vive"), o microtonalismo, Tutaméia do Guimarães Rosa (as faixas, assim como os contos no livro, estão dispostas em ordem alfabética), os anos 80 ("falo que os anos 80 é que foram uma prévia dos anos 10; a gente tá vivendo de novo nesse clima um pouco apocalíptico"). O tema principal em Malva, porém, vem de um mito africano denominado Eleyé, que fala sobre mulheres-pássaro feiticeiras.

"É sempre baseado nessa mulher-pássaro, que está fazendo uma trajetória do seu vôo [durante as faixas]. Se ela não aparece, há uma voz feminina cantando ela", diz.

As participações de cantoras e cantores se espalham ao longo do disco, assim como a mais aparente aparição de Felipe Zenicola, do Chinese Cookie Poets, no tríptico "Ornitofrenia", principal single e única faixa completamente eletrônica de Malva. "Na parte [de Zenicola, a central] você ouve o silêncio, mas também ouve as frequências sem corte. Isso cria uma tridimensionalidade, como se algo soltasse da música. E isso a complementou muito bem."

Malva levou cinco anos pra ficar pronto — uma coincidência, levando em conta que Löis trabalha em alguns projetos ao mesmo tempo, e este foi o primeiro a ser começado. "Tá sendo uma doidera, porque paralelamente a isso, eu estou querendo tocar as músicas, formar uma banda. É um processo lento mas é seguro, eu sei muito bem o que eu quero", diz.

Ouça Malva abaixo: