FYI.

This story is over 5 years old.

Música

Stephen Brodsky Fala Sobre Cave In, Miley Cyrus, Sir Lord Baltimore e o Novo Disco do Mutoid Man

'Bleeder' é uma série de riffs fodões e uma baita curtição.

Foto por Yvonne Jukes

Mutoid Man é uma superbanda que desafia qualquer conceito que vem acompanhado deste título. Mas antes de tudo, o Mutoid Man é diversão pura. Em um recente show “surpresa” no St. Vitus, no Brooklyn, o trio alcoolicamente tocou algumas faixas de seu EP de estreia e do disco Bleeder, enquanto mostravam o dedo do meio uns aos outros entre passagens instrumentais complexas e um cover de “She’s a Lady” de Tom Jones. Nada de cara mau, apesar de sua complexidade hardcore-meio-math – só uma série de riffs fodões e uma baita curtição.

Publicidade

Seu approach e a atitude positiva brilham em Bleeder, lançado no dia 30 de junho pelo selo Sargent House (no iTunes e também em formato físico), e também disponível para streaming abaixo. Ouça o álbum completo enquanto lê uma entrevista em que Stephen Brodsky fala sobre o futuro do Cave In, a formação do Mutoid Man e como manter as coisas num clima de família.

Noisey: Qual é seu projeto principal? Existe isso? Uma prioridade?
Stephen Brodsky: Olha, por definição, já tenho o Cave In há 20 anos, mas a essa altura é meio complicado reunir todo mundo para criar algo por uma série de razões. Alguns dos caras tem compromissos sérios com suas famílias e não moramos na mesma região também. É como qualquer outra coisa: quando você está dentro da sua própria bolha, fica complicado sair dela. Acho que o lance com o Cave In é que não lançamos nada há quatro anos, e acho que para essa banda rola um elemento meio próspero nisso de ser criativo e tocar mesmo sem ter um disco para promover ou mesmo com apoio de uma gravadora – agora o Cave In nem gravadora tem, tecnicamente. A banda meio que está parada agora no sentido de que não sabemos muito bem qual nosso próximo passo ou se existe um próximo passo a ser dado agora.

E isso contrasta com o Mutoid Man, que é uma banda nova, com bagagem quase zero. E temos uma gravadora – não uma qualquer, mas uma das melhores – que está empolgadaça com a gente. É um esquema diferente agora. Sinto que é muito mais fácil botar a bola pra rolar com o Mutoid Man já que fizemos um disco novo, e falando em termos de tocar mesmo, é coisa do Ben, é o que ele faz, saca? Então por mais que ele tenha uma família pra dar atenção, a música é o sustento do cara. Não sei se isso responde sua pergunta, mas acho que não é mais uma questão de algo ser prioridade, é só meio que-

Publicidade

Como as coisas vão acontecendo.
Isso. Tudo tem acontecido muito rápido com o Mutoid Man agora, então só estou meio que acompanhando.

Quanto a isso, fica claro que você e Ben têm uma história longa juntos, tendo crescido na mesma cena. Uma cena tão pequena e unida, a de Boston nos anos 2000, muita banda boa saiu dali. Como vocês conheceram o Nick, só morando ali no Brooklyn mesmo?
Estávamos falando sobre isso um dia desses. Acho que a primeira vez que interagi com o Nick foi no Saint Vitus, curtindo mesmo, não tinha nem ido ver algum show em específico. Lembro dele chegar no bar, saindo de onde a banda tocava, meio chateado. Eu estava sentado ali e ele colou do meu lado – acho que o Artie estava no bar – e mandou algo tipo “Artie! Preciso de uma dose!”, colado em mim e gritando que precisava tomar uma urgentemente. Ele estava puto e começou a conversar comigo, aleatoriamente. “Essa merda de banda tocando agora, uns cuzões, o vocalista fica chutando meus retornos no palco e quebrando minhas paradas, tem umas 30 pessoas ali e o corno age como se fosse um estádio lotado”. Aí ficamos trocando ideia e eu pensando ‘ah, tá certo. Isso parece interessante’. Aí entro e vejo um cara surtadaço no palco.

Parece engraçado.
E aí eu lembrei disso, saca? E ele tem esse visual específico, então foi meio fácil lembrar do cara quando o encontrei pouco depois. Tinha um show marcado no Saint Vitus. Só pra dar uma agitada nas coisas, acho que Ben e eu estávamos conversando algo tipo “e tudo aquilo que a gente feito juntos, vamos ali tenta tocar”. Daí meti isso no meio do show e por coincidência Nick era o cara do som naquela noite e acabamos tocando o que veio a se tornar o Mutoid Man. O Nick cuidava da mesa de som, então a banda toda já estava lá, tecnicamente.

Publicidade

Pode crer.
Acho que o Nick mesmo disse: “Se vocês quiserem um baixista, me avisem”. Acho que ele tinha o e-mail do Ben antes por algum motivo qualquer e então entramos nessa do bicho ficar nos mandando umas gravações de sua banda, Brohammer. E a gente pensava “cacete, isso é bastante técnico, esse cara sabe tocar, saca?’” e foi assim que começou.

Ben e eu sempre zoamos que somos os caras velhos meio de saco cheio na banda, e como é bacana ter um jovenzinho com os olhos brilhando pra dar uma equilibrada. Ao mesmo tempo, também penso que Nick já passou tanto tempo na noite quanto a gente. Ele trabalha numa casa noturna, então vive lidando com bandas.

Aguentando todos os egos do mundo.
Exatamente. Daí penso, “quer saber, nossa experiência é meio que a mesma né?” Se você encarar as coisas assim e tal. Bicho, eu não aguentaria fazer o que ele faz.

Sei que ele já saiu em turnê cuidando do som da Cyndi Lauper e tem umas histórias muito loucas.
Acho que ela devora os caras do som no café da manhã, dá uma de louca. Mas ele, com todo aquele charme, parece que passou no teste, sobrevivendo ao mundo de Cyndi, o que é revelador.

Suponho então que tudo isso tenha rolado por conta da época mesmo – já que o Ben nem mora mais no Brooklyn.
Por aí. Quando me mudei pra lá, ele já tinha todo seu equipamento em um estúdio que dividia com uma galera, era só uma questão de tempo até eu chegar lá com as minhas coisas, que estavam guardadas há quase um ano. Aí continuamos de onde havíamos parado tempos atrás, quando Ben tocou no Cave In por um ano. Começamos a compor coisas novas, algumas lançadas em k7 pelo Cave In, duas músicas que havíamos feito com Ben. Algum tempo depois, Ben e eu começamos a fazer jams aleatoriamente quando estava em Nova York. Eu estava em um relacionamento à distância até me mudar pra cá, então vinha sempre até Nova York e a gente dava uns rolês quando eu estava pela cidade. Isso foi entre 2007 e 2010 ou 2011? Só começamos a compor músicas pro que veio a ser o Mutoid Man quando me mudei pra cá.

Publicidade

Eu e um amigo estávamos falando sobre bateristas, e sendo bem sincero, tem dias que vejo a sua banda ou o Converge ou o All Pigs Must Die ou o Acid Tiger e poderia muito bem só ficar ali assistindo ao Ben. Ele é um baterista fenomenal. Você lembra qual foi a primeira vez que o viu tocar?
Não tenho uma lembrança exata de vê-lo tocar, não como a da primeira vez que o vi. Mas acho que nunca vou esquecer de botar o Jane Doe pra rolar e ouvir “Concubine” pela primeira vez. Tem alguma coisa naquela batida na caixa que rola aos 20 segundos da música que me fez pensar “agora vai”. É uma metranca que vem do nada. Pra mim, foi ali que o Converge assumiu uma outra estatura. E tendo tocado na banda durante alguns anos, sabia das frustrações que eles passaram com outros bateristas antes de Ben. Coisas que eu também senti em algum ponto. Então parecia ter rolado uma espécie de perdão quando chegou a esse ponto de “pô, finalmente! Era isso que eles queriam fazer desde o início”. Em termos de musicalidade, tudo se encaixa.

Esse é um dos lances que é memorável do Mutoid Man. Acho que a sua banda é bem técnica, mas de um jeito bom. Tem muita banda aí que toca pra caralho e manda a estrutura pro diabo por conta das escalas chocríveis que conseguem tocar. Essa era uma preocupação de vocês? Não fazer a banda soar como uma aula de guitarra?
Acho que com o Mutoid Man rola muito mais aquela ênfase na música ser boa ou não. Há uma diferença entre ser técnico e não deixar espaço para imaginação e tocar de propósito em uma ordem para que os ouvintes possam imaginar o que mais pode rolar. Isso é muito forte no reggae, e que eu adoro. Tipo, boto um Desmond Dekker ou algo assim e posso ouvir, e cantar junto e fazer minhas próprias harmonias com aquilo, minha percussão ou uma linha de guitarra que não está ali, mas apareceu na minha cabeça, por ser um molde tão simples que te permite fazer isso.

Publicidade

Acho que essa é uma puta característica das primeiras bandas de rock dos anos 60 e 70, você ouve uma adaptação do blues. O blues é foda no sentido de que é tão destituído de qualquer coisa – é música feita para ser ouvida e talvez contar com a participação do ouvinte entre cada trecho. Então vem o rock dos anos 60 e 70 e amplifica isso, com os Stones, The Who, Led Zeppelin, pegando aquele lance do blues do delta e amplificando. Mas ainda há aquele espaço sendo preservado. Acho que a atração que temos por bandas como Sir Lord Baltimore, Grand Beyond, Grand Funk e todo o resto é que aquilo é rock com uma puta energia, mas ainda há espaço para improviso aqui e ali. E ao vivo isso é ótimo porque as músicas não são tão complicadas de forma a te deixar preso a estruturas criadas em um disco. Dá pra brincar um pouco.

Considerando que vocês estavam meio distantes geograficamente quando esse disco ainda estava em estágio de incubação, como ele foi feito?
Fizemos o disco no decorrer do inverno e ele será lançado dia 30 de junho. A gente mandava muitos vídeos um pro outro enquanto Ben morava na Costa Oeste. E ainda temos uns 40 ou 50 minutos de riffs, que basicamente sou eu tocando de manhã cedo, de cueca e perguntando “ o que vocês acham?”. Tem uma porrada de coisas que ainda nem começamos a mexer.

Claramente vocês escolheram as ideias certas para compor o disco. Agora, falando da gravação, o que vocês queriam mudar em relação ao EP?
Em termos sonoros o EP ter saído tão bem foi sorte, levando em conta que gravamos tudo em quatro canais num estúdio do tamanho de um closet. Ben estava pra sair em turnê com o Converge e iria se mudar pra Costa Oeste logo depois. Daí pensamos “ok, temos que registrar isso de alguma forma”. A banda nem tinha nome direito, mas nós nos chamávamos de Narcoleptic Beagle.

Publicidade

Como é que é? Era uma piada interna?
Acho que era só uma questão de como íamos organizar aquilo no iTunes, todas aquelas demos que gravamos. Aí metemos a mão a na massa e gravamos por gravar mesmo. Foi um golpe do acaso aquilo ter sido nosso primeiro lançamento. Foi culpa do Andrew Schneider, engenheiro de mixagem, que deixou o som daquele jeito. Ele tava fazendo uns lances loucos tipo passar a bateria por quatro compressores e adicionando samples… Foi incrível.

Então sabíamos que se íamos lançar um disco pela Sargent House, não poderia ser gravado ali, teríamos que ir num estúdio onde pudéssemos separar a banda do engenheiro. Daí sabíamos que trabalhar com Kurt Ballou era nossa primeira opção. Todos nos conhecemos há tempos, Ben toca no Converge, eu toquei no Converge, o Cave In gravou com o Kurt, era meio óbvio.

Coisa de família.
Isso, e Kurt é bem direto com suas opiniões, e isso era algo que queríamos porque tudo que havíamos feito chegou a um ponto que precisávamos de alguém falando “por que você está fazendo isso? Tenta assim”. Teve muita abertura para que alguém como Kurt chegasse e tornasse o som bom o bastante pro Mutoid Man.

Além disso, sabíamos que queríamos tocar ao vivo porque o EP foi gravado ao vivo. Acho que isso dá certo clima ao Mutoid Man. E foi isso. Praticamente não houve edição. Então o que soa atraso ou aceleração no tempo ou que soa meio errado, deixamos lá. É assim que a gente toca, sabe? E o Kurt ficou de boa com isso.

Publicidade

Às vezes, ainda mais se tratando de punk, ser meio tosco é meio que “feliz incidente”. Mesmo que sejam detalhes. Um tempo desses estava falando de Misfits e como eles não são a banda mais certinha, mesmo gravada, mas que isso é um charme.
Sim, é um teste. É tipo “o quanto você quer ouvir essa música incrível?”. Beleza. Eis o desafio: você terá que aguentar duas guitarras desafinadas, uma produção que se deu em três ou quatro horas, e olha só, aprendemos a tocar a música ontem. Você encara? Consegue ouvir a música? E com o Misfits é assim, nove de cada dez vezes.

Exatamente. Porém, que bacana que vocês optaram por gravar ao vivo. Imaginei que vocês teriam muitas chances para fazer overdubs, com tudo complexo demais para rolar ao vivo.
Sempre esqueço quão intenso é o processo de gravação até começar a gravar. E acho que antes desse disco, eu mesmo cuidei de muito das gravações das minhas músicas durante muitos anos. Até o último disco do Cave In fizemos no nosso estúdio. Então fazia um tempo. Tipo mais de cinco ou seis anos que eu entrei em estúdio como no caso do Mutoid. E sim, esqueci como era. Sabe como é, para manter a energia no alto enquanto grava-se uma música diversas vezes pra acertar, e gravando ao vivo, a banda toda era uma trilha só, entende? Se alguém errava, provavelmente tínhamos que fazer tudo de novo. E foi meio enlouquecedor porque seus colegas de banda estão em cima de você, e você em cima deles. E, sabe como é, tinha um monte de cordyceps [espécie de fungo alucinógeno], cogumelos, alpha brain [tipo de suplemento “para o cérebro”], e estimulantes mentais, e café, e barrinhas energéticas pra passar por aquilo tudo. Advil, o que precisasse. É tipo um coquetel rock’n’roll do Steve Brodsky de 2015, saca? [Risos] Muita emoção.

Vocês acabam de fazer uns shows com o Dillinger Escape Plan. Vai rolar mais?
Vai! Acabamos de confirmar uma turnê nos EUA como headliners para agosto. Somos uma banda nova e acho que está na hora de tocar em alguns dos buracos espalhados pelo país e ver como seremos recebidos lá fora! [Risos]

Além disso, o Cave In participará de um festival em Atlanta chamado Wrecking Ball.
[canta] I came in like a wrecking ball! [Risos] Será que a Miley vai? Será que ela vai fazer uma participação especial?

[Risos] Parece ser um puta festival. Imagino que a última vez que o Cave In tocou em Atlanta deva ter uns mil anos.
Foi em 2009 com o Coalesce, divulgando um EP chamado Planets of Olde. Então naquela época fizemos dois shows com eles no Scion. Tocamos na Knitting Factory em Los Angeles, e no Masquerade em Atlanta

Sabe, da primeira vez que fomos lá parecia o lugar certo pra se tocar se você estava no rolê underground, hardcore, emo. Era do meio pro fim dos anos 90. Era como tocar na sala de alguém. Tinha esse cara, o Gavin, responsável pela organização, e era o mano com a distro e os discos de todo. Mas falo de emo mesmo, antes desse rímel todo e cabelos terríveis.

Uma das formas pelas quais o Cave In fez conexões com essa parada foi por meio de uma banda chamada Inkwell. Lembra deles? Philip Dwyer era o vocalista e também o responsável pelas artes – talvez ele até seja designer mesmo, era o que ele fazia antes ou faz hoje pra se sustentar, mas estou falando de 95 ou 96. Amo aquela banda e lembro de escrever cartas pra ele tipo “cara, sua banda é foda. Posso te mandar uma demo da minha?” e mandei uma demo do Cave In e ele foi super receptivo. Então a gente trocava cartas. Quando o Cave In ainda lançava 7” nos anos 90, antes de conseguirmos o contato da Hydra Head, nós fazíamos a arte dos discos e tudo mais. Então lembro que era nosso segundo 7”, split com Early Grace. O disquinho se chamava “Are We Still Fixable” e a arte ali era meio que copiada do que rolava nos discos do Inkwell, e foi de propósito mesmo, tipo “temos que fazer algo que pareça com Inkwell”.

Tradução: Thiago “Índio” Silva