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PMs intimidam civis em audiências públicas de SP

Relatos dão conta de que Policiais Militares estariam marcando presença em assembléias para discussão do Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos.
PMs durante a audiência pública em Franca. Foto: Reprodução.

O que parece uma ação coordenada extraoficialmente por parte da Polícia Militar de São Paulo ganhou mais um capítulo na última terça (22), durante uma audiência pública na cidade de Franca para discutir o Plano Estadual de Educação em Direitos Humanos de São Paulo. O plano pretende implementar a educação de direitos humanos em áreas como a educação básica, educação superior, educação não formal, educação e mídia, para profissionais da Justiça e na segurança pública. Após a elaboração do texto-base, audiências públicas tem sido presididas no interior e na capital do estado de São Paulo. No entanto, desde o começo de agosto, relatos dão conta da presença de Policiais Militares fardados e à paisana nessas assembleias, posicionando-se contra a chamada "ideologia de gênero" nas escolas.

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Em Franca não foi diferente. Segundo Paulo Mariante, advogado e Coordenador do Fórum Municipal de Defesa dos Direitos Humanos de Campinas, dos 300 presentes na audiência "70% eram PMS". "Muitos fardados e alguns armados", diz Mariante. "Na discussão das propostas tentaram desfigurar alguns aspectos do Plano e em algumas votações conseguiram", relata. O advogado diz também que a atitude dos PMs era bastante "ostensiva" e chegou a constranger vários presentes.

"Muitos [PMs estavam] fardados e alguns armados" — Paulo Mariante

"A presença de policiais militares seria muito bem-vinda, desde que fosse para ajudar a construir o Plano, e não para destrui-lo. E a postura agressiva de alguns deles também não ajuda. Ontem, por exemplo, eles propuseram extirpar toda a parte de Educação Popular em Direitos Humanos", diz o advogado à VICE.

Mariante também relatou que um PM teria agredido verbalmente uma jovem , a intimidando durante as discussões das diretrizes.

Outro caso similar ao de Franca aconteceu no último dia 3 de agosto, na cidade de Registro. A ativista da Marcha Mundial das Mulheres Rosana Rocha relata ter visto uma presença ostensiva de policiais durante a audiência na cidade.

"Um sargento da PM falou que não houve ditadura militar porque não teve um ditador." — Rosana Rocha

"O primeiro trecho [do Plano] falava sobre a ditadura militar", conta Rocha. "Um sargento da PM falou que não houve ditadura militar porque não teve um ditador. Eles queriam que tirassem essas indicações do texto."

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"Eles [PMs] também se manifestaram contra outras observações na discussão de gênero", diz a ativista. "Um deles disse que era muito cedo pra falar de educação sexual. Eles [PMs] queriam que substituísse para 'direitos civis' todos os trechos em que se falava de 'direitos humanos'", diz ela. "Até sobre a educação de jovens e adultos, um sargento disse que essas pessoas que estudam depois de mais velhas só 'querem saber de baderna'."

A participação de PMs em Santos, no auditório da Unifesp, onde dezenas de Policias Militares levantaram placas onde se lia 'Bolsonaro 2018'.

A participação mais noticiada dos PMs nessas audiências ocorreu no dia 11 de agosto, em Santos, no auditório da Unifesp, onde dezenas de Policias Militares levantaram placas onde se lia "Bolsonaro 2018" — e também pediram a troca do nome de "direitos humanos" para "direitos civis" no texto do Plano Estadual. Nos itens suprimidos pelos PMs está a inclusão de direitos humanos na formação de um agente público do estado, por exemplo.

A "invasão" da PM durante a audiência gerou confusão. A Associação dos Docentes da Unifesp publicou uma nota de repúdio sobre o ocorrido: "Depois de perderem uma proposta, militares agrediram verbalmente professores e estudantes, chamando-os — mais uma vez — de 'vagabundos'. Nas votações subsequentes, intimidaram-nos fazendo pessoalmente a contagem dos votos e filmando, fotografando e olhando de modo ameaçador para cada um que votava contra a posição deles", relatou a oficialmente a ADUNIFESP.

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No blog oficial do Plano Estadual, foi publicada uma nota sobre o corrido na Unifesp da Baixada Santista. Segundo a declaração, a Coordenação "cobrará punição rigorosa em relação a qualquer comportamento que destoe do esperado de uma autoridade pública, ainda que não em serviço" e "também manifesta preocupação quanto à possível presença de policiais militares em serviço durante as audiências". A Coordenação ainda disse que a presença de PMs nas audiências será bem-vinda, desde que os mesmos se apresentem "sem farda e desarmados, de maneira a não representar qualquer forma de intimidação (ainda que não intencional) aos demais participantes."

A VICE entrou em contato com a Secretaria de Segurança Pública de São Paulo (SSP-SP), em busca de informações sobre as participações dos PMs nessas reuniões, mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem.

Enviamos as seguintes perguntas para o órgão:

- A participação de PMs em audiências públicas é incentivada pela SSP e o Comando da PM?

- A SSP está apurando os casos de intimidação relatados nessas audiências?

- A SSP e o Comando da PM costumam dar orientações sobre Direitos Humanos para policiais militares? Por que há uma rejeição tão forte por parte dos PMs presentes nas audiências quanto ao tema?

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