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Música

Depois da Plastic People: um Projeto Para o Futuro da Vida Noturna de Londres

O Clube londrino que teve entre seus residentes nomes como Theo Parrish, Four Tet e Carl Craig fechou as portas no final de 2014 e nos fez pensar na necessária revitalização da noite na cidade.

O ano novo é sempre uma época adequada para uma autoanálise piegas e tendenciosa. É um período de reflexão, de pensar e imaginar exatamente por que achamos que poderíamos comer churrasco quatro vezes, curry outras cinco e McDonald's outras duas, tudo na mesma semana e sem ganhar peso. Normalmente, o mais longe que as nossas meditações durante a ressaca vão é fingir que vamos começar do zero e parar de beber, comer bem e fazer exercícios. Neste ano, os clubbers londrinos foram forçados a considerar algo ainda mais desanimador: a vida noturna na cidade sem a Plastic People.

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A venerável instituição, um clube absolutamente fundamental para a dance music no Reino Unido, fechou no final de dezembro de 2014. Com o cerramento das suas portas perfeitamente indistintas no fim da Curtain Road, outro prego foi definitivamente colocado no já crivado caixão da noite londrina. À medida em que nos aproximamos cada vez mais de uma cidade em que sair à noite é um privilégio particular da galera de mocassim e camisa rosa dos clubes exclusivos do Chelsea e dos buracos infelizes e sem alma de Mayfair, a Plastic People é parece mais necessária do que nunca.

Um porão sujo e ordinário que era o lar da lendária noite de dubstep FWD>>, da noite You're a Melody, do Floating Points, em que o Theo Parrish foi residente por muito tempo, e milhares de festas de uma noite só que permanecem na memória, a Plastic People representava uma espécie de essência fundamental do clubbing, do que ele deveria e como poderia ser.

O nosso luto por uma engrenagem vital da sua máquina é a chance de fazer uma calma e estoica avaliação do presente e olhar com esperança para o futuro. Embora a noite de Londres ainda não esteja exatamente pronta para ser jogada num incinerador e ter suas cinzas espalhadas sobre as margens fétidas do Tâmisa, precisamos fazer um balanço e reexaminar para onde ela está indo.

CONSCIÊNCIA ESPACIAL 

A bundamolização da noite de Londres é assustadora: armazéns viram palácios santificados de gim; velhas lojas de informática se transformam em cafés esquisitos; frequentados essencialmente por esnobes empunhando o Observer, e as margens encharcadas do Soho são substituídas por Primarks.

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Você pode culpar o Buzzfeed ou o mercado imobiliário mundial pela sua ambição desmedida em construir lugares baseados no marketing, mas sempre há a possibilidade de dar um novo fim para os espaços, mesmo que à força, numa manobra de Heimlich, na parte central de Londres. Pense em noites como a Rhythm Section, em Peckham, sediada no Canavan's, o bilhar gloriosamente sujo da Rye Lane, ou a Local, afiliada à Trilogy Tapes, que ocupa de pubs a arcos ferroviários em Brixton, ou ainda a The Occasional Feel Good, que transforma o Island Art Studios de Herne Hill em uma brisante fantasia disco.

À medida em que a cidade se transforma num monumento grosseiramente ampliado aos artifícios do capitalismo da Oxford Street, cabe aos promoters e seus patrocinadores perceber o que o resto de nós já encara: a existência de uma Londres que reside fora dos limites aconchegantes da Zona 2. Com os dois anéis internos aparentemente lotados, oficialmente, o reconhecimento de lugares como Honor Oak Park, Mill Hill, Osterley, Abbey Wood e Preston Road se torna ainda mais necessários. São lugares resolutamente suburbanos que abrigam espaços semi acessíveis, áreas comerciais que DJs e produtores abandonam, seduzidos pelas luzes piscantes de Canary Wharf em manhãs úmidas de quarta-feira. Esses são os lugares que precisam sentir o caloroso abraço de centenas de clubbers suados, reunidos perto de áreas residenciais às seis da manhã para fumar um cigarro redentor. Esta é a Londres propositalmente ignorada sobre a qual Zadie Smith não escreve, nem é filmada pelo Richard Curtis, e é isso o que a torna perfeita para uma nova área de clubes. É onde você deveria construir para fazê-los vir. Eu espero.

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NÃO ACREDITE NO HYPE

Parte do charme e do apelo do Plastic People – além dos DJs estelares, do incrível sistema de som e da escuridão decadente – era o fato de que ela nunca levantou a própria bola. Embora você possa argumentar que o clube não necessariamente precisava disso e que teria uma fila até a Great Eastern Street pronta para fazer isso por ele, a Plastic People ter mantido a humildade é digno de nota. Londres precisa de mais clubes, festas, promoters, DJs e produtores puramente dedicados a fazer seu trabalho – e fazê-lo bem. A autoedificação infinita é desnecessária e broxante.

Qualquer buzz deve ser espontâneo, resultado da qualidade, do boca-a-boca, de uma tentativa genuína de encher de ar novamente os pulmões de uma metrópole noturna que está lentamente submergindo. Não queremos hashtags ou campanhas virais, não precisamos de mais festas que falem de si mesmas à exaustão antes mesmo que o residente termine o primeiro set. A cidade precisa de pessoas querendo começar por baixo, criar um grupo de seguidores de base, desenvolver – através da locação, dos DJs e do ethos em geral – algo semelhante à uma transformação cultural.

Isso pode ser pedir demais, mas se queremos levar isto a sério e nos engajar ativamente em uma discussão sobre o futuro da noite de Londres, precisamos ir além das paredes sujas dos lugares, do bar e da cabine. A vida das pessoas mudou em função da sua peregrinação semanal à FWD>>. E, como resultado, a cultura de clubes britânicas mudou para sempre também. Isso, certamente (esperamos) pode acontecer de novo. Não pode?

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PENSE GLOBALMENTE, AJA LOCALMENTE

Por mais tentador que seja imaginar que o mundo inteiro exista apenas para que a gente chape em espaços subterrâneos todo fim de semana, tem um planeta lá fora que não liga tanto para os vinis do Galcher Lustwek, os podcasts do L.I.E.S. ou "Lady Sunrise (NYC Sunrise)" quanto nós. Logo, precisamos pensar sobre os potenciais benefícios à comunidade em abrigar clubes. Ele pode ser usado durante o dia? Pode ser atraente para um número maior de pessoas? Vai trabalhar junto com os seus vizinhos para assegurar que seja visto como um lugar positivo no geral?

Frente ao "Keep Calm e Seja Facista" de Boris Johnson e companhia destruindo tudo que é interessante, original e desafiador, a sustentabilidade de uma vida noturna genuína em Londres depende deste tipo de abordagem multifacetada. Faça o jogo deles. Sirva café e conserte bicicletas no local ou algo do tipo. Faça sets curtos do Screen Downtown durante a semana ou coisa assim. Enfim, só pareça um pouco interessante para o tipo de pessoa que se anima com as resenhas de pubs do Time Out.

(NEM SEMPRE) PENSE (QUE UM) GRANDE (NOME É MELHOR)

Se você for até o Resident Advisor, vai ver que, em qualquer sábado, é praticamente garantido que aproximadamente 68% dos maiores DJs do mundo estarão resmungando sobre alguma coisa no banco de trás de um táxi. Isso é ótimo. Isso é incrível. Isso também é o que leva à homogeneidade, à paralisia e a fossilização daquilo que amamos. A Plastic People corria riscos. Certo, tinha uma pista muito menor que, digamos, a Fabric ou o Ministry, o que presumivelmente acarreta em menos pressão em fazer muito sucesso e presumivelmente garante mais liberdade criativa.

Essa sensação de liberdade, essa habilidade de poder tocar a casa quase sem restrições resulta em uma agenda estimulante e inovadora que não cai na armadilha do clube/nome grandes. Pense deste jeito: descendo aquela escada de metal, nas últimas semanas de existência da Plastic People, você pode ter se acabado com o boogie explosivo cheio de edits do Tiger & Woods, os samples de discos antigos de todos os cantos do mundo garimpados pelo Gilles Peterson, o house esquisito e distorcido do Axel Boman ou a disco cósmica, estratosférica e cintilante do Prins Thomas. Você pode ter visto o Low Jack fazendo sua excêntrica parada dub, ou testemunhado o holandês I-F em toda a sua pompa techno. Pode ter surtado ouvindo o Four Tet e o Floating Point tocarem do jazz ao juke. Em suma, era um clube sem medo do imprevisível.

Vamos correr riscos, Londres. Vamos parar de contar com os nossos dez DJs favoritos todo fim de semana. Vamos fazer diferente. A vida noturna é muito importante para a experiência londrina para deixá-la desaparecer e ser engolida pelo buraco negro, aberto com verba pública, do Parque Olímpico.

Josh está no Twitter: @bain3z

Tradução: Fernanda Botta