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As vantagens de ser uma sereia profissional

O sereismo não é só diversão e glitter.

Claire. Fotografia por Jonathan Thirionet.

Por algum estranho motivo, nos últimos anos, usar roupa de sereia é agora uma opção de carreira. Nascido nos Estados Unidos, o "sereismo", em geral, envolve enfiar as pernas dentro de uma cauda, muitas vezes feita em casa, e abaná-la freneticamente em espectáculos aquáticos e dentro de piscinas em festas particulares.

Como estava interessada em descobrir um pouco mais sobre este ofício, entrei em contacto com a Claire, uma mulher de 25 anos que reivindica o posto de primeira sereia profissional francesa. Há cinco anos que esta bonita loira usa o seu hobby, que agora se pode chamar emprego, para ajudar a pagar um doutoramento. Ela está a terminar a tese, intitulada "Os Mitos, Símbolos e Arquétipos das Produções da Disney".

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"O sereismo é muito mais difícil do que se pode imaginar", garantiu Claire no nosso primeiro encontro. "Tens que nadar com uma cauda de 15 quilos presa às pernas. Como se isso já não fosse bastante stressante, ainda precisas de manter os pés juntos e os olhos bem abertos dentro da água salgada."

Fotografia por Alexa Maurin.

Depois de terminar o ensino secundário, Claire caiu directamente no cruel mundo do mercado de trabalho. Por culpa da sua natureza artística, começou por tentar trabalhar como actriz de teatro e modelo, mas não gostou de nenhuma das duas coisas. Depois de navegar por diversos sites norte-americanos, encontrou o sereismo – profissão que combinava o seu interesse por nadar com o seu amor pelo glitter. Para sua infelicidade, só foi capaz de encontrar uma mulher a viver o sonho do sereismo, uma americana chamada Hanna Fraser. Hannah considera-se uma activista marinha e é famosa por passar o tempo vestida de sereia a nadar com tubarões.

Curiosamente, em França, nunca ninguém tinha ouvido falar de sereismo, então a nossa pioneira, Claire, aceitou a complicada missão de dar o pontapé inicial. As dificuldades para encontrar uma fantasia de sereia para adultos são tão grandes, que ela foi obrigada a confeccionar a sua própria roupa, com uma ajudinha de um tutorial do YouTube.

Só precisou de algumas sessões de fotos e do lançamento de um site pessoal para começar a ser conhecida. Não foi preciso muito tempo até o Aquário de Paris ligar e oferecer-lhe trabalho num espectáculo. Tudo que ela tinha de fazer era arranjar-se e nadar dentro de um tanque cheio de raias e peixes venenosos. E, realmente, era isso mesmo o que a Claire estava à procura. O espectáculo logo ganhou popularidade e é, actualmente, uma das principais atracções dentro da programação do espaço.

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Fotografia: cortesia do Aquário de Paris.

Um dia acompanhei a Claire para ver como são os preparativos para uma apresentação deste estilo. Parece ser uma árdua tarefa: são necessárias duas pessoas para vestir e fechar a cauda e, depois, a sereia é levada até a piscina por um colega. A partir daí, são dez minutos de coreografia subaquática cheia de graça, balanço e bolhas cadenciadas. Enquanto a Claire está ocupada a ser a Ariel, uma voz narra a história da criatura mítica metade mulher, metade peixe. Claro, os adultos não acham nada de especial, mas as crianças adoram.

A Claire tem a consciência de que o trabalho não é exactamente complicado, mas também não é fácil. Ela ainda precisa de fazer todas as suas caudas – pode parecer simples, mas não é. Tem de estar tudo correctamente ajustado para que a cauda, quando a Claire entra (ou é atirada) para dentro do tanque, não se encha de água. Depois de já ter confeccionado várias roupas, Claire considera-se uma especialista. Passou a usar silicone, mais resistente à água, mas também mais caro. Aparentemente, é impossível comprar uma boa cauda por menos de 1 400€. Como se diz nos círculos das sereias: se sabes fazer uma boa cauda, não é difícil ganhar uns trocos.

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De vez em quando, a nossa sereia recebe telefonemas de organizadores de festas que lhe pedem para ela actuar como decoração humana, sentada num lago raso ou numa pedra molhada, ou simplesmente para fazer o que fazem as sereias.

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"Acho que a festa mais louca que já fui foi no ano passado, numa ilha grega. Um bilionário ia comemorar o aniversário da filha e eu tinha que ficar sentada na praia, vestida de sereia, dando as boas-vindas aos barcos que chegavam."

Geralmente, as pessoas respeitam bastante. Claire ainda não se deparou com nenhuma proposta indecente: "Tenho sorte, ainda não aconteceu comigo", afirmou. "Mas claro, ouve-se falar deste tipo de coisas. Existe uma fábrica de caudas de sereia, bastante famosa nos Estados Unidos, que ganhou má fama por fazer produtos para filmes pornográficos."

Ela já recebeu pedidos para posar sem a parte de cima do biquíni em ensaios fotográficos, mas não estava interessada. "Na verdade, não é a nudez que me incomoda. Mas um dia quero ser professora, e não quero destruir a minha reputação".

A Claire é uma das sereias que têm sorte. Segundo ela, muitas são constantemente assediadas por uma enorme variedade de pervertidos, com ofertas para participar nos espectáculos fetichistas mais assustadores.

A situação é um pouco diferente para os homens, segundo um amigo da Claire, o Alexis, um auto-proclamado "Tritão". Há algum tempo investiu muito dinheiro em caudas bastante caras, mas ainda não mergulhou no mundo das sereias. No entanto, isso não impediu que ele fosse manchete de uma das maiores revistas gays da Alemanha.

"Acho que esse ambiente é mais fácil para os homens. Eu não recebo o mesmo tipo de propostas obscenas que muitas sereias recebem", disse-me o Alexis quando falei com ele.

Actualmente em viagem pelos Estados Unidos, a Claire aproveitou para peregrinar até o Weeki Wachee Springs, parque que organiza espectáculos de sereias desde 1950. Ela teve a oportunidade de se apresentar e até recebeu uma proposta de emprego. Ao contrário da Claire, o Alexis não tem interesse em fazer carreira – só acha divertido. Diz que já ficará satisfeito se puder desfilar, sentado com a sua magistral cauda, num trio elétrico na Parada Gay.

A cena do sereismo está em rápido crescendo. A primeira escola de sereias francesa foi inaugurada no dia 23 de Maio, fundada por Julia Lemmi Sardella e pelo marido, Claudio. O instituto vai funcionar como um projecto paralelo à principal empresa do casal, que produz espectáculos aquáticos. "Hoje em dia surgem escolas de sereias por todo o mundo. Estão em todos os lados: Filipinas, EUA, Alemanha, Espanha e França. Atraem uma clientela bem diversificada, de todas as idades. A nossa maior ambição é fazer parte do desenvolvimento de um novo desporto que combine exercício físico e movimentos artísticos", pode ler-se no press release da instituição.

Ainda me custa acreditar da existência real de um espírito desportivo no sereismo, mas, justiça seja feita, é um bom entretenimento. E parece estar a crescer: dois meses depois da abertura, a Academia de Sereias do Mediterrâneo, em Tarragona, em Espanha, já tem mais de 500 alunos matriculados.