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Outros

Meu Porão Tóxico

Passamos os últimos meses fazendo vista grossa pra quaisquer problemas ou deficiências para pagar pelo menos metade do aluguel.

Moro com dois amigos em um prédio abandonado nos limites de Williamsburg e Bushwick, no Brooklyn. Nos mudamos pra lá sem assinar contrato ou pagar depósito, e passamos os últimos meses fazendo vista grossa pra quaisquer problemas ou deficiências para pagar pelo menos metade do aluguel que nossos amigos pagam.

Sábado à noite, porém, os corredores começaram a feder muito. Tipo, muito, muito mesmo. Ouvimos falar que o cheio de carne humana apodrecendo é o pior de todos, e o fedor impregnando nossos corredores se encaixava exatamente nessa descrição. Conforme anoitecia, o cheiro ia piorando. Claro, estávamos no meio do processo de tirar um monte de lixo e nossa entrada estava abarrotada de sacos, mas esse cheiro não fazia parte da gama de cheiros de um lixo comum, e como meu amigo TH e eu logo deduzimos, vinha do porão. Nenhum de nós havia entrado no nosso porão, e vale lembrar que estávamos bem chapados e assustados, mas o cheiro era tamanho que decidimos em grupo descer lá pra investigar.

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Armados cada um com um faca, um taco de baseball e uma lanterna, nós três amarramos camisetas em nossos rostos no melhor estilo pixador e então descemos. Até com as camisetas o cheiro estava fazendo nossos estômagos rebolarem. No final das escadas tinha uma porta. Conforme descíamos escada abaixo, ouvi uma voz aguda, mas abafada. Instintivamente, corri pra saída, tropeçando nos degraus e quase capotando o meu outro colega de apê, o Brayden, que estava diretamente atrás de mim. Enquanto eu e o Brayden esperávamos no começo das escadas, o TH bateu com a faca na porta e berrou: “Quem está aí?! Vou te matar, porra!” Nossa vizinhança não é muito conhecida por ser “segura”, então sentimos que uma situação não-civilizada iria acontecer. Por favor, não se esqueça do cheiro de carne podre.

O cara que abriu a porta era um cara latino com mais ou menos a idade do meu pai, com o cabelo perfeitamente branco e uma higiene visivelmente muito boa. Ele nos deu as boas vindas ao seu apartamento de 185 m2 de forma educada com seu inglês muito ruim.

À nossa esquerda havia uma casa de caldeiras ou uma área de bombeamento que havia sido muito inundada, com fezes (cocôs) humanas visivelmente dejetadas no chão. O cara pegou um pedaço de pau e começou a bater numa poça de água marrom enquanto falava que “estava tentando consertar a inundação”. Ele então nos guiou pelo porão. Depois de atravessar 5 cm de água de xuca, chegamos onde supomos que fosse o seu quarto, uma pequena masmorra com um futon sujo, uma pequena televisão antiga passando desenhos animados mexicanos, e uma caixa de lixo que havíamos jogado fora no começo da semana. Na sua porta havia uma lousa branca escrito com uma caneta: “Lixo nuclear: não é minha culpa. Por favor chame ajuda”.

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A esquerda do seu quarto havia uma porta com uma etiqueta azul da polícia que dizia alguma coisa como a área atrás da porta era classificada como “Área Morta”. Não tem como eu ser a única pessoa que nunca tinha ouvido falar de uma coisa como essa. Não dando ouvido ao medo de ser morto assim que entrasse, abri a porta e encontrei uma despensa lotada de caixas de vitaminas passadas da validade da loja de “suplementos nutricionais” do andar de cima. Também havia um pilha de tralhas variáveis, incluindo um computador e um monitor da era 386. Estava olhando pro computador quando percebi que ainda não havia encontrado um banheiro.

O Brayden e eu puxamos o TH de lado, pois achávamos que ele estava sendo simpático demais com nosso anfitrião. Dividimos mais algumas coisas estranhas que havíamos percebido e de que agora não me lembro mais (chapado) e decidimos que era hora de sair à francesa. Antes de sair, nosso anfitrião nos disse que mora em Manhattan e que “Agora ia assistir um pouco de desenho”, depois fez um barulho de peido com a boca e um movimento de punheta com a mão. Não sei bem o que isso significa.

Voltamos pra casa pra lavar as mãos e respirar um pouco de ar puro. Não chegamos num consenso sobre o que fazer. Estava um pouco perturbado com a placa na porta avisando sobre o Lixo Nuclear, e pelo fato de que descemos com máscaras no rosto e tacos de baseball e facas, e que isso nem o perturbou. No final, nossa decisão foi fumar mais um baseado e capotar.

No dia seguinte o cheiro havia sumido, então não vamos mais nos preocupar muito com isso.

TEXTO POR DAN MEYER
FOTOS POR BRAYDEN OLSON
TRADUÇÃO POR EQUIPE VICE BR