FYI.

This story is over 5 years old.

Música

O Legowelt É o Esquisitão Místico Favorito do Techno

E obviamente que o disco novo dele, 'Crystal Cult 2080', é incrível.

Ele é um dos produtores mais inovativos, trabalhadores e consistentes trabalhando no techno de hoje, mas o Legowelt também é – talvez necessariamente – um dos mais estranhos. Ele dirige um e-zine cyberpunk, possui tantos sintetizadores que sua casa em Haia, nos Países Baixos, está prestes a explodir e seu novo álbum Crystal Cult 2080 é inspirado (em parte) por um ritual medieval de cânticos do século IX e ritmos polifônicos. Suavão.

Publicidade

Nós absolutamente amamos o Crystal Cult 2080 aqui no THUMP, então encontramos o produtor holandês para conversar sobre suas influências, práticas e se ele acreidta que o techno ainda pode ser um som rebelde.

THUMP: A sua música como Legowelt sempre teve um interesse ativo em misticismo e ocultismo e isso é, provavelmente, mais evidente no Crystal Cult 2080. O que te atrai nisso tudo como produtor?
Legowelt: A música em si é, com certeza, muito mística. Ela sempre foi usada em rituais místicos. Se você observar, as músicas de house e techno são um tipo de ocultismo – sob um certo ponto de vista. As pessoas tentam entrar em transe ou tomam certas substâncias para entrar em uma dimensão mais elevada.

Mas como isso funciona para você na prática?
Notas musicais e algumas frequências trabalham em seu cérebro de uma certa maneira. É oculto porque as pessoas não sabem o que realmente está acontecendo, mas elas são atraídas por ele. Como você pode ouvir no álbum, há fortes influências da música medieval. No mundo ocidental – por volta do séc. IX, eu acho -- eles começaram a usar a música polifônica em igrejas cristãs. Essa música veio do leste e foi usada para influenciá-los a ponto de estarem em um estado de transe.

Levando isso em conta então, você acha que o estado de transe que o seu trabalho visa criar leva a uma experiência interior? Não soa como se você estivesse procurando uma vibe de pista de dança coletiva.
É pessoal, definitivamente. Este álbum deve ser uma experiência interior.

Publicidade

Como você traduziu essas ideias antigas para o techno moderno?
A percussão é uma tradução mais estilística que eu coloco na música, mas a música medieval era também muito simples ritmicamente. Era apenas um tambor tocando o mesmo padrão o tempo todo, por isso não é tão difícil de fazer uma transição para uma sonoridade mais moderna. Eles são muito parecidos. O techno é um pouco mais rápido e é criado com instrumentos eletrônicos, mas, no final, é praticamente a mesma coisa. Techno deve ser simples.

E o canto no álbum também. Letras como "Beba do cálice e você vai renascer."
Em algumas faixas, definitivamente. Isso é um tipo medieval de canto. Essa letra "Beba do cálice" foi tirada do filme Excalibur. Esse é um bom sample da velha guarda da rave; se você ouvi-lo na balada, você pode beber do cálice e renascer através do techno.

Como você encontrou esse sample? Você é um fã do filme?
Eu estava conversando com TLR [dono da gravadora Crème Organization], fazendo piadas sobre música, e nós dissemos que seria legal samplear uma fala daquele filme.

Você discute a sua música com seus amigos enquanto você está compondo; pede sugestões, toca o material para eles?
Ocasionalmente, mas não em um nível muito intenso. Às vezes uma ideia nasce quando estamos conversando ou passando um tempo juntos, como "Oh, como seria engraçado fazer uma faixa sobre isto e aquilo". É mais em detalhes como seleção de faixa e sua ordem. Tem sempre um elemento de influência de outras pessoas, no entanto. Ideias e conceitos muitas vezes infiltram-se na música de forma subconsciente.

Publicidade

Eu sei que o nome do album é uma homenagem ao sintetizador digital que você usou na gravação. Ultimamemente você tem transitado bastante entre o analógico e sintetizadores digitais. O que te atraiu nesse sintetizador em especial para fazer este álbum?
Isso é difícil de dizer. Eu gosto quando a música é muito… obscura. É bom quando você anda na rua e está nebuloso. Sua imaginação funciona de forma diferente porque você não pode ver as coisas com clareza; apenas sombras e contornos. Se você usar uma grande quantidade de efeitos nebulosos – como delays antigos, reverbs e filtros – a música torna-se mais sombria. Você ainda pode ouvir as melodias, mas elas estão um pouco escondidas e você pode começar a escolher como as contra-melodias irão interagir com outras melodias. Eu espero que isso torne a música mais emocionante de se ouvir, que aquele que estiver ouvindo possa descobrir melodias secretas e sua imaginação possa ser testada.

Para mim, não importa muito o que você usa para fazer música porque dentro do hardware há um chip de computador também. Todo esse negócio de hardware versus software, digital versus analógico, é completamente sem importância para mim. A maneira que eu vejo isso? Eles são todos instrumentos. Eu acho que o purismo é uma coisa muito ruim, porque você se limita muito. Purismo pode ser um beco sem saída.

O que te influenciou musicalmente na composição do Crystal Cult 2080?
Bom, um monte de coisas de Detroit, definitivamente. Minha faixa "Experiential Awakening" é muito influenciada pelos sons de Detroit do DJ Stingray. Eu escuto um monte de Actress. Eu gosto de como ele usa as melodias. É muito estranho. Ele também tem essa vibe nebulosa em sua música. Tem um monte de influências de sons antigos do Aphex Twin também. Se você ouvir algumas faixas – especialmente as do começo dos anos 90, quando ele usava batidas de break e bateria eletrônica R8 Roland – você pode ouvir essas influências na minha música muito bem, eu acho. Suas melodias são realmente boas. Elas são como fragmentos. O Huerco S também tem essa mesma vibe de melodias fragmentadas. Ele só para e começa – então desaparece. Algumas das faixas parecem muito harmônicas na forma como as melodias andam. Acho todos eles muito interessantes.

Publicidade

Como você acha que o novo álbum se diferencia de seu último, The Paranormal Soul?
As faixas são mais detalhadas. Como as melodias caminham, elas são um pouco mais avançadas. O último álbum era principalmente um disco de pista de dança e este é um pouco mais profundo. A produção é também um pouco mais consistente.

Eu sei que você fez a maior parte do álbum em lugares diferentes, durante um grande período de tempo. No entanto, o álbum soa muito coeso. Qual é o seu procedimento quando, tipo, você tem uma ideia para uma faixa?
Quando é gravado em algum outro lugar, eu só faço um esboço. A etapa final foi feita aqui no meu estúdio em casa, o que explica por que tudo isso soa coerente. Como as melodias funcionam e a vibe certa de cada faixa, eu ainda posso fazer isso em um quarto de hotel, em um computador, com uma máquina.

Isso é bem típico de seu trabalho então, ir pegando ideias e ir construindo as músicas no momento?
Eu gosto de fazer isso, eu sempre tive essa necessidade. Quando estou descansando no quarto do hotel, eu pego os equipamentos e começo a tocar.

Ao vivo você se concentra no sintetizador que você usou para produzir o álbum ou alterna entre analógico e digital de novo?
Isso depende de onde eu toco e se eu posso levar um sintetizador. Às vezes eu levo um sintetizador analógico comigo, às vezes um sintetizador digital e às vezes é apenas o laptop com o controlador. Tudo depende de como eu me sinto e da situação do clube.

Publicidade

Você acha que a estética e os sons do oculto são uma forma de colocar o techno como um tipo ainda rebelde ou de contra-cultura de música, depois que ele se tornou um gênero mais comercial?
É claro que isso já existia nos anos 80, com Psychic TV. Eles também tinham uma cultura muito mística em torno de sua música, o que é muito interessante. Eles tinham o Temple of Psychic Youth. Eu acho que isso influenciou toda essa vibe oculta, mística, em torno deles e isso era muito contra-cultural na época. Eu acho que todo tipo de música que tenha uma cultura em torno dela é misteriosa. Eu não penso nisso como uma coisa de contra-cultura ou rebelde. É apenas a música que eu faço. Eu posso imaginar que ela pode ser chamada de rebelde, porque é contra as formas triviais de se pensar. Eu acho que é isso o que eu sempre fui, até certo ponto.

O que você acha que o techno precisa fazer para continuar seguindo em frente?
Deve sempre ter pessoas que o empurram para além ou fazem coisas que outras pessoas não fazem. Aqueles que apenas fazem suas próprias coisas e não são influenciados por pressão daqueles do lado de fora. Acho que essa é a principal coisa de ser rebelde. Faça algo que você mesmo quer fazer, que vem de dentro de você mesmo, e não preste muita atenção ao que os outros pensam sobre isso ou dizem. Você deve apenas fazer isso.

Você sempre parece tratar a música como um trabalho de amor. Sua produção é uma loucura e você tem que trabalhar constantemente. Como você acha que o clima de produção de música eletrônica é atualmente, especialmente com a imensa facilidade de acesso a software e redes sociais?
É uma coisa muito boa, porque se você quiser fazer música agora você pode começar daqui a uma semana, porque tudo está na internet. Tem manuais em vídeo de como operar um sintetizador, de como sequenciar a música, você pode se treinar dentro de uma semana. Você tem muitos contatos com as mídias sociais e fóruns, há um lugar para todos, onde podem simplesmente se divertir e crescer. Eu acho que quase todos os artistas que começaram nos últimos 15 anos começaram sua carreira na internet.

Você não acha que isso é positivo demais?
Eu não vejo por que isso não seria positivo. Não existe uma outra maneira. Existem gravadoras que só fazem um vinil e só vendem em lojas de discos, mas é através da internet que as pessoas sabem sobre ele. É apenas uma parte essencial da vida de todo mundo agora. Eu não vejo de outra maneira.

Você pode seguir Lauren Martin no Twitter aqui: @codeinedrums