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Música

Discos: Yves De Mey

Fura-nos a cabeça com o propósito de expandi-la e não apenas violentá-la.

Frisson
Archives Intérieures
2013 Yves de Mey é um ninja: tem surgido geralmente onde menos se espera e deixado a marca de um golpe fatal por onde passa. Não é sequer muito normal encontrarmos um produtor belga numa ascensão tão entusiasmante, mas Yves de Mey supera rondas, tal qual o Van Damme de Força Destruidora, e não há pó atirado para os olhos que o consiga parar. Estamos portanto perante um ninja improvável que, nos últimos anos, conseguiu editar, na Line, um disco de música feita para uma peça de bailado e, na Sandwell District, um poderoso duplo doze polegadas. Este último, denominado Counting Triggers, surgiu pouco antes da mítica Sandwell District encerrar a sua actividade, ainda num momento de alto fulgor criativo, embora consciente de que o seu dever na renovação da techno estava cumprido. Sem vergar à implosão da tal label, Yves de Mey é um produtor que depois de arrumar uma missão só descansa quando estiver envolvido noutra mais complexa. É o próprio Ninja de Antuérpia que aqui assina a estreia da label que partilha com Peter Van Hoesen, a Archives Intérieures. O objecto chama-se Frisson e trata-se de um EP, lançado exclusivamente em CD, que dispõe de tempo para quase tudo (inclusive para duas remisturas, uma delas a cargo de Miles Whittaker, dos Demdike Stare). Dentro desse “tudo” cabem a techno com uma arquitectura de sala de pânico (“Cadence” é isso mesmo), glitch para foder os nervos dos monges (experimentem “Phoresis”) e passagens várias em que a tendência é experimental, e talvez por isso capaz de atrair de uma forma muito distorcida, quase maldosa. Podíamos ficar ressabiados com isso, mas Frisson fura-nos a cabeça com o propósito de expandi-la e não apenas violentá-la. Com a cabeça expandida é mais fácil aderir a tudo o que Frisson tem de magnificamente atmosférico (nesse aspecto fica muito perto de conseguir um sufoco de hostilidade semelhante ao de Só Deus Perdoa, o último — e melhor? — filme de Nicolas Refn). Além disso, Yves de Mey, tal como Burial ou Andy Stott, é um daqueles produtores que parece já ter chegado a uma fórmula qualquer que ainda não é totalmente compreendida pelos restantes (e que por isso também provoca um interesse quase religioso). Frisson pede — por esta ordem exacta — adaptação, atenção e devoção. Não é todos os dias que encontramos um disco assim.