FYI.

This story is over 5 years old.

Filmes

Sexta edição do Music Video Festival traz programação política

Evento em SP exibirá pela primeira vez no Brasil dois filmes elogiados que discutem questões bastante atuais: o longa 'Ponto Cego' e o documentário 'MATANGI/MAYA/M.I.A.'.
Imagem do documentário MATANGI/MAYA/M.I.A.. Foto: Reprodução

Realizado desde 2013 em São Paulo com o objetivo de abrir espaço para a produção audiovisual ligada à música (clipes, documentários), o MVF (Music Video Festival) completa seis anos de vida entre esta sexta (28) e domingo (30), no MIS, com sua edição mais política.

O evento exibirá pela primeira vez no Brasil dois filmes elogiados que discutem questões bastante atuais, como racismo, feminismo, preconceito, machismo, imigração, violência policial e gentrificação.

Publicidade

O MVF normalmente rolava apenas entre sábado e domingo, mas neste 2018 o festival ganha também a sexta-feira, dia dedicado a discussões sobre o mercado audiovisual. E é nesse primeiro dia que ocorrerá uma sessão para convidados do filme Ponto Cego, dirigido por Carlos López Estrada e que estava na competição do festival de Sundance no início deste ano.

Não é exagero afirmar que Ponto Cego é dos mais impactantes filmes do ano. Foi escrito por Daveed Diggs e Rafael Casal — amigos de infância que cresceram em Oakland na Califórnia, eles também interpretam os dois personagens principais do longa. Diggs é o mais conhecido da dupla. Ele é MC do trio de rap clipping. e fez parte do elenco do premiado musical Hamilton.

Em Ponto Cego, Diggs vive Collin, um negro que passou meses condenado por um crime meio violento, meio cômico e está há poucos dias de se livrar da condicional. Seu melhor amigo é Miles, um branco com o corpo preenchido por tatuagens e que tem dificuldade em controlar a raiva.

Collin e Miles trabalham juntos numa empresa de mudanças (a ex-namorada de Colin também é funcionária no local). Amigos desde crianças, a dupla é praticamente inseparável, e Miles, mesmo branco, se sente inserido na comunidade negra da cidade (ele é casado com uma negra e tem um filho).

Mas (e aqui está um dos vários méritos do filme) por mais que Miles queira, ele sempre será branco. E, por isso, não vai passar pelas intermináveis dificuldades enfrentadas por Collin. Por exemplo: em uma noite, Collin vê um policial branco matar com quatro tiros um jovem negro. O que ele faz? Denuncia o caso e arrisca perder a chance de se livrar da condenação? Ou fica na dele?

Publicidade

Outro mérito do filme. Collin pontua várias situações com rimas de rap, tipo freestyle. O hip hop faz parte do cotidiano dos dois amigos, indissociável da existência deles. Mais um mérito. Mesmo abordando questões sérias, Ponto Cego não se afasta do humor. Não que o filme seja uma comédia, mas mesmo cenas e situações graves são tratadas com sensibilidade e leveza.

“Um dos principais desafios do filme, desde o primeiro dia, foi a forma como lidaríamos com essa intersecção entre assuntos sérios e o humor”, disse à VICE o Carlos Estrada. “Acho que Daveed e Rafael fizeram um excelente trabalho ao misturar no roteiro os momentos de humor com os mais graves. Ficou bom porque são situações que têm muito de real. Oakland é uma cidade bem legal, mas também é muito complicada, é muito colorida, mas está mudando muito, é agressiva, tem crime, tem pobreza, mas tem música. O tom do filme é um resultado de tudo isso. Daveed e Rafael tentaram transpor tudo o que eles viam e sentiam pela cidade em um filme.”

Estrada afirma que espera que Ponto Cego entre para “uma família de filmes únicos feitos por pessoas afro-americanas e que lidam com racismo, problemas sociais, que falam de comunidades pouco representadas no cinema”. São filmes como Boyz N Tha Hood, Faça a Coisa Certa, Fruitvale Station e Corra!. “São histórias que estão ficando cada vez menos raras e mais populares no cinema, de pessoas que ocupam uma parte grande da população deste país. São histórias que precisam ser contadas.”

Publicidade

Já no sábado, e aberto ao público, o MVF exibe MATANGI/MAYA/M.I.A., documentário dirigido por Steve Loveridge que disseca a tragetória da cantora MIA, da infância até os dias atuais.

O material de arquivo é impressionante. Isso porque MIA, antes de ser atraída por sintetizadores e microfones, teve como paixão uma câmera de vídeo. E ela desde sempre a usou para documentar sua trajetória pessoal e profissional.

O pai da cantora foi o fundador de um grupo que lutou contra o governo do Sri Lanka por uma área reivindicada pelo povo da etnia Tamil. Em 1986, aos 11 anos, M.I.A., dois irmãos e a mãe foram para a Inglaterra como refugiados. Ela reencontrou o pai em Londres anos depois.

M.I.A. aproximou-se de Justine Frischmann, da banda Elastica, e criou capa de disco e clipe para o grupo.

Alguns anos depois, iniciou carreira solo com a ajuda de produtores como Diplo. A inclassificável união de gêneros como rap, funk, electro, breakbeat e outros fez de MIA uma artista única, e principalmente depois do hit "Paper Planes" ela tornou-se nome conhecido mundialmente.

A questão da guerra civil do Sri Lanka sempre foi abordada por MIA em músicas, clipes e entrevistas, e muitas personalidades não a levavam a sério ('como essa cantora que ganha uma enormidade de dinheiro fica falando da guerra de um país pobre?', questionava-se na imprensa).

MIA fala abertamente sobre o preconceito que sentiu durante a carreira por ter a pele escura e ser imigrante. Fala ainda sobre a ida ao Super Bowl em 2012, como convidada de Madonna. Durante o show do intervalo da partida, MIA mostrou o dedo do meio para uma câmera. A NFL, liga que organiza o futebol americano e é tradicionalmente conservadora, não gostou e processou a cantora em mais de US$ 16 milhões.

Publicidade

MATANGI/MAYA/M.I.A. é uma espécie de videobiografia e resposta de MIA aos ataques que ela sente ter sofrido durante anos. É um documentário que tem a música como ponto de partida, mas que ganha brilho ao tratar de política, ativismo, machismo e preconceito.

Além dos filmes, o MVF 2018 terá talks e shows de nomes como Jaloo, Lucas Santtana, Drik Barbosa, Emicida, Bivolt, Djonga e Karol Conká, entre outros. A entrada é gratuita.

Veja a programação em http://www.musicvideofestival.com.br.

Siga a VICE Brasil no Facebook, Twitter, Instagram e YouTube.