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Música

Auntie Flo Rebate Críticas de "Apropriação Cultural"

O DJ comentou o bafafá que deu o Boiler Room da Autonomous Africa na última terça (2).
Brian d'Souza (à direita) com Esa (esquerda), um colaborador frequente da Highlife.

Na última terça (2), toquei no Boiler Room que rolou no Sub Club de Glasgow com o Midland, o JD Twitch e o General Ludd. Representávamos a Autonomous Africa – uma gravadora chefiada pelo JD Twitch, da Optimo. O objetivo do projeto é lançar dance music de inspiração africana e doar os lucros para instituições de caridade do continente.

O show no Boiler Room foi criticado por uma suposta apropriação cultural. Mais especificamente, foram feitos comentários de como a Autonomous Africa poderia representar erroneamente uma raça ou continente. Entendo como, à primeira vista, a combinação do nome "Autonomous Africa" com quatro DJs brancos do Reino Unido possa ser problemática. Também estou ciente da controvérsia gerada pelo novo single do Bob Geldof para o Band Aid, criticado pelo retrato degradante que fez do continente africano em sua tentativa de arrecadar fundos para o combate ao ebola. Faixas como "Do They Know It's Christmas?" nos lembram como, em alguns aspectos, o Ocidente ainda repete antigas atitudes imperialistas em nome de ajuda humanitária.

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Sim, a política de lançar singles para caridade pode ser arriscada. Mas tenho fé de que a música possa ser um enorme catalisador para a mudança social – no sentido de que possa derrubar fronteiras e abrir mentes para outras culturas. Também acredito que, quando se trata de música, acusações de apropriação não devem ser feitas a torto e a direito.

Pense na cultura do sampling – um item básico em todas as formas de música nas últimas três décadas. Tudo, do hip-hop ao house e drum and bass, não poderia ter sido criado sem samples. No entanto, a técnica consiste basicamente em pegar música mais antiga e misturá-la a algo novo e fresco. Há uma linha tênue entre o sampling e a apropriação, mas isso não significa que um deva ser confundido com o outro.

Acredito firmemente que o meu papel como DJ e promoter seja reunir diversos estilos de música e apresentá-los a um público de uma forma que o contagie e emocione. O DJ tem um papel vital no mundo de hoje como curador cultural. Isto é um privilégio. Cerca de cinco anos atrás, comecei a produzir sob o pseudônimo Auntie Flo e a organizar uma festa chamada Highlife. Os dois projetos me possibilitaram promover um novo tipo de música que eu sentia que não recebia a devida atenção nas pistas europeias, onde house, techno, electro e disco são onipresentes.

Esta nova música não era feita no ritmo das batidas 4/4 de Detroit, Chicago e Berlim, mas por produtores na América Latina, África, Oriente Médio e Ásia. No entanto, não podia ser classificada como "world music", um termo altamente problemático, com conotações eurocêntricas e coloniais, quase racistas. Meu objetivo era simples – compartilhar esses empolgantes novos sons com o público do Reino Unido, e se isso abrisse os seus horizontes para música e cultura novas, melhor ainda!

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Para este fim, a Highlife levou para o UK artistas do Chile, México, Costa do Marfim, Tanzânia, Índia, Estados Unidos, Canadá e diversos países da Europa. Recebemos artistas como Rebolledo, Charanjit Singh, Jamal Moss e Raoul K. Ao mesmo tempo, meu trabalho como Auntie Flo combina influências musicais de todo o mundo com os sons de afrofuturistas como Sun Ra, Afrika Bambaataa e Drexciya. Desde o meu disco de estreia, Future Rhythm Machine, de 2002, tive a sorte de colaborar com cineastas da África do Sul e cantores de Gana e Costa do Marfim. Lancei faixas pelo selo chileno/alemão Comeme e, no ano que vem, vou lançar uma série de colaborações musicais feitas em Cuba, Quênia e Uganda.

Meu ponto é que a música negra não é algo que deva ser exclusivamente tocado por músicos negros para um público negro, da mesma forma que a música branca não deve ser restringida a ouvidos brancos. Só podemos fazer a cultura musical avançar através da fusão de estilos, da troca de ideias e da colaboração sem fronteiras.

Não havia artistas negros no Boiler Room de terça. Mas isto não devia automaticamente ser motivo para censura. Preciso qualificar meu envolvimento dizendo que sou metade goês, que minha mãe nasceu no Quênia, que eu produzo e faço turnês com um sul-africano e que nosso cantor é ganês?

A música deveria ser livre. Não criemos fronteiras desnecessárias.

Tradução: Fernanda Botta