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Música

O Sul-Africano Black Coffee É o Rei do Afro-House

Depois de recusar um contrato com a Sony, Maphumulo conta por que se mantém independente e onde pretende levar sua música.

Toda criança que mora no meio do nada luta contra o tédio diariamente e sonha com seu dia de fuga. Mas quando esse lugar é um município sujo e pobre da África do Sul, as incríveis festas na praia de Ibiza soam como um planeta alienígena muito distante. No entanto, o DJ sul-africano Nathi Mamphumulo - vulgo Black Coffee - sempre soube que seu futuro seria bem longe de Umlazi, um município fora de Durban, onde ele cresceu. Recentemente, quando sentei com ele numa noite qualquer no Brooklyn, em Nova York, antes dele ir tocar em uma rave, Maphumulo parecia ser a imagem perfeita de um DJ que viaja o mundo todo: jaqueta de couro brilhante, calças verde escuras e um boné de aba reta estampado com o nome de um de seus artistas favoritos, Basquiat.

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"Desde pequeno, sempre pensei: Eu não pertenço aqui, minha família não pertence aqui". Ele disse, se recostando em uma cadeira giratória. Ele logo cedo decidiu transcender suas origens fazendo o que faz de melhor: tocar soulful house em pistas de dança abarrotadas de gente. Hoje, Maphumulo é mais do que um DJ de house music. Ele é um ícone nacional - um exemplo para seus compatriotas do que sul-africanos negros são capazes de conquistar em um país onde as desigualdades pós-apartheid ainda são tão presentes. E o mais impressionante: Maphumulo se tornou o DJ sul-africano mais famoso apesar de tocar com apenas uma mão.

O acidente aconteceu em 11 de fevereiro de 1990, o dia em que Nelson Mandela foi libertado da prisão. O país inteiro estava celebrando e Maphumulo, que na época tinha 14 anos, estava na rua com sua família e amigos. Do nada, um taxi arrancou com tudo em direção a multidão, atingindo Maphumulo e danificando permanentemente sua mão esquerda. Muitos acharam que seu sonho de se tornar um DJ tinha ido para o saco, mas Maphumulo perseverou, ensinando a si mesmo a girar os discos, apesar de sua deficiência. Em uma prova à grande determinação que o trouxe até aqui, exatamente 20 anos depois, Maphumulo virou manchete no mundo todo quando tocou por 60 horas seguidas em uma tentativa de quebrar o recorde mundial Guinness.

Apesar de ser uma das maiores celebridades sul-africanas, foi recentemente que começou a se estabelecer no mercado internacional. Em 2014, graças a uma recomendação do Seth Troxler, Maphumulo completou o rito de passagem dos DJs: tocou na festa Circo Loco na ilha das festas mais badaladas do mundo, Ibiza.

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Maphumulo se recorda vividamente de sua experiência em se sentir um estranho no ninho. "Eu estava muito nervoso. Nunca tinha ido para lá. Eu tinha uma ideia diferente do que era a música na ilha - eu achava que era uma cena muito comercial". Antes de partir para Ibiza, Maphumulo visitou alguns amigos que trabalhavam em uma rádio de dance music tradicional na África do Sul para descolar umas músicas que, achava, seriam boas para seu set. "Eu tinha um repertório do Calvin Harris. Pensei comigo: vou destruí-los". Ele diz sorrindo. "E daí eu cheguei lá, e a música era muito minimalista. E pensei, nossa, estou em casa."

Maphumulo começou a fazer música eletrônica em 1997. Um dos seus primeiros remixes era uma faixa de soulful house do Lenny Williams, chamada "Cause I Love You", que resultou em uma oferta (rejeitada) da Sony Music. Ele estava tocando em uma festa enorme na África do Sul. "Tinha um DJ famoso que não estava feliz com o fato de eu tocar depois dele. Ele tava tipo, 'Quem é você? O que você vai tocar?'", disse Maphumulo. "Eu mostrei três CDs meus. Ele não se abalou. Todo mundo tinha uma mochila cheia de gravações."

Mas quando Maphumulo tocou o remix do Lenny Williams, no final do seu set, levou a plateia a loucura. Um executivo de uma gravadora da Sony o procurou depois e fez uma proposta ali mesmo. Maphumulo recusou. "Eu já tinha meu próprio plano. [Esses caras de grandes gravadoras], especialmente no meu país, querem apenas firmar um contrato. Eu expliquei a ele que tinha minha própria gravadora, e se fosse para fechar algo com ele, teria que ser um acordo de licenciamento. Aquilo o deixou incomodado", recorda Maphumulo. "Eu sabia o que queria e isso deixava muita gente puto da vida. Eles ficavam tipo, 'Esse cara, ele sabe demais'".

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Maphumulo credita este senso de independência agressivo a uma antiga experiência com sua ex-banda, o trio de afro-pop SHANA (que incrivelmente significa Simply Hot and Naturally African). O grupo tinha um contrato com a gravadora Melt 2000, e Maphumulo diz que o selo londrino inadvertidamente fez com que eles fossem estereotipados pelo temido rótulo de "world music". "Assim como qualquer jovem, nós queríamos ser famosos!", ele exclama. "Não queríamos ser colocados em uma prateleira qualquer."

Infelizmente, estereotipagem é um problema que muitos artistas sul-africanos enfrentam ao tentar entrar para o mercado global. Maphumulo diz que espera que um dia os artistas sul-africanos sejam reconhecidos por suas próprias qualidades, em vez de serem reduzidos a meros "artistas africanos". "Se não, nós sempre seremos indicados a um 'prêmio especial'. Eu fui indicado a um desses pela MTV, e nem sequer botei na minha biografia porque ele não significa nada para mim. Quero estar em uma categoria onde todos estão."

Há um outro problema parecido na África do Sul, que é a quantidade de artistas sul-africanos representados na mídia ou na rádio. "A música que toca na rádio sul-africana é 20% produzida por artistas locais, e 80% internacionais. Essa é nossa próxima briga.", ele diz. "É nisso que quero trabalhar agora, mesmo que eu consiga apenas um milhão de assinaturas em uma petição."

Com sua turnê norte-americana apenas começando e alguns shows em Ibiza marcados para o próximo verão, Maphumulo diz que está pronto para evoluir com o Black Coffee. "Eu sou conhecido na cena de soulful house há muito tempo. Agora estou tocando para plateias maiores. Eu ainda toco músicas autorais, mas quero mudar um pouco o estilo do Black Coffee". Ele pausa e se inclina para frente em sua cadeira. "Um Black Coffee mais maduro."

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Michelle Lhooq é editora assistente do THUMP - @MichelleLhooq

Tradução: Stef Cannone