Tomorrowland Brasil: Para onde aponta a bússola do EDM no país?
Rodrigo Zaim/R.U.A

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Tomorrowland Brasil: Para onde aponta a bússola do EDM no país?

A segunda edição do festival foi ligeiramente menor que sua estreia por aqui, e depois de uma morte registrada no evento, a pergunta é se a festa tem fôlego para durar até 2020.

Um ano passa rápido. Ou pelo menos era o que boa parte do público da estreia do Tomorrowland Brasil repetia pra si mesmo em 2015. Isso porque a expectativa para a segunda edição do festival começou antes mesmo do fim da primeira edição. Eu bem me lembro do público frenético querendo saber a data do evento em 2016 ainda durante o set de encerramento do David Guetta no ano passado. E com tanta aflição pelo que estava por vir, não é difícil imaginar que muita gente queimou a largada.

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Vai ver por isso mesmo logo que entramos no Parque Maeda em Itu, na quinta (21), já vimos uma equipe de bombeiros perguntando pra um garoto caído no chão se estava tudo bem. O rapaz, meio aéreo, afirmava com a cabeça: "Tudo bem". Por isso, nós e ele seguimos cada um seus caminhos. Nós, esperando por um festival de proporções ainda maiores. E os jovens esperando se divertir ainda mais esse ano.

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Em dúvida de qual set assistir no início da segunda edição do Tomorrowland Brasil, e andando pelo espaço onde os palcos foram montados, logo deu pra ver que tinham diminuído a área dos palcos — que neste ano eram seis, contra sete de 2015. O que, digamos, não era exatamente um empecilho, já que andar lá dentro ficou mais fácil e as longas distâncias do Parque Maeda, um tanto mais curtas.

A estrutura ainda que ligeiramente menor que a do ano passado, continuava seguindo o padrão belga de organização: muitos banheiros, cenografia de cair o queixo, pirotecnia de todos os tipos, formatos, cores, luz (muitas luzes) e som da melhor qualidade. Para entrar e sair do festival foi mais fácil esse ano e não havia filas capaz de deixar os frequentadores putos da vida — li apenas um registro de que havia uma fila de duas horas para entrar na área VIP na quinta (21).

Ainda na andança de reconhecimento, fui ver o set do Alok no main stage, o DJ que não foi ofuscado nem mesmo por toda técnica e respeito do Guetta, que fechou o palco principal no primeiro dia e um dos poucos naquela sexta a fazer a merecida homenagem ao Prince que nos deixou naquele dia.

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MESTRE DE CERIMÔNIA

Espécie de mestre de cerimônias do festival, Alok tocou por volta das 19h dando as boas-vindas oficiais à galera que lotava o mainstage naquele frisson típico de início de festa. Muita gente estava ali especificamente pra ver o rapaz de 24 anos tocar — identificado como um dos mais importantes nomes do EDM mundial. Ainda assim, o DJ fez um set sem surpresas, tendo arrancado gritos do público com a hiperentoada "Seven Nation Army", do White Stripes. E o mais curioso da sua seleção estava no fato de ele falar com uma voz robótica-du-mal destorcida (resquícios do seu passado trance?) no microfone, do qual anunciou: "Essa foi a apresentação mais insana da minha vida".

Veja? "O que é EDM, afinal?"

Alok, inclusive, foi o único brasileiro a ter destaque no palco principal do evento. A escalação do Tropkillaz que, imaginei, geraria uma comoção maior por parte do público no main stage, passou meio despercebida muito por conta da hora que eles tocaram na sexta (22) — às 15h, pouca gente lotava o espaço dominado por muita poeira e castigado pelo sol forte.

Ainda no primeiro dia do festival, já tínhamos uma boa pista do que seria a música do palco principal ao longo dos três dias: incontáveis remixes de "Work", da Rihanna; "How Deep Is Your Love", do Calvin Harris, mais "Seven Nation Army"; "Lean On", do Major Lazer e o caquético clássico "Sweet Dreams", do Eurythmics. Enfim, a máquina sugadora de pop radiofônico que é o EDM, que engole música pop para regurgitar música ainda mais pop e assim sucessivamente. Não acho que isso seja muito novidade também, e o público se amarra incansavelmente. Então, firmão!

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Por outro lado, no segundo e terceiro dia de festival tivemos boas surpresas vindos de palcos secundários. No sábado (22), o palco da XXXPerience se tornou o reduto psytrance reunindo uma pequena legião à espera do brasileiro Chapeleiro e do set da dupla israelense do Infected Mushroom. No sábado (23), último dia de festa, o palco LUV.N.BEATS foi dominado por artistas do D.O.C, subselo da Kompakt comandado pelo Gui Boratto. Lá, vimos o live do L_cio ser aplaudido pela galera que acompanhava a performance do rapaz que mistura techno a uma interferência ao vivo da sua flauta transversal.

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No mesmo sábado, o palco da Diynamic do Solomoun se firmava como espaço adulto do festival com sets marcadamente techno 4x4 dos alemães do selo do residente da Pacha em Ibiza — foi bonito. Isso sem falar na reunião do Marky and Friends lotado do drum and bass com Patife tocando no fim de tarde e Marky fervendo a noite acompanhado do MC Stamina fazendo o mais catártico dos sets dos palcos secundários.

FORA DA CURVA

O ponto fora da curva do festival aconteceu na madrugada do sábado (23), quando o mineiro Luiz Ricardo Parreira, de 32 anos, morreu. Depois de ser prontamente atendido pelos bombeiros que trabalhavam no festival, o rapaz não chegou vivo ao hospital São Camilo, em Itu. Notícia de morte em rave sempre gera aquele esperado furdunço moralista sobre o uso de drogas em festas do gênero.

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O lance, porém, é que uma coisa sempre esteve (e vai continuar) associada a outra. Jovens usam drogas em raves, assim como em shows de sertanejo ou em festas universitárias. O problema é como e em que quantidade as drogas são consumidas. E a culpa disso certamente não é nem do jovem consumidor (embora muita gente queira criar aqui uma relação de causa e efeito), nem do festival em si, mas muito mais do controle que se faz do consumo das substâncias.

Explico: em 2015, até mesmo a Polícia Federal fez uma operação intitulada "Terra do Amanhã", na qual foram apreendidas, entre outras substâncias, nove quilos de metanfetamina. Ano passado, o controle por parte da fiscalização no Tomorrowland parecia maior também — eu mesma sequer tive a mochila revistada neste ano ao entrar no festival.

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A expectativa do público — e nossa aqui do THUMP também — era de que esse ano a festa seria ainda maior. Os números, no entanto, registram uma pequena queda em várias frentes. Tivemos menos DJs escalados, menos palcos montados e um público menor (esse ano foram 150 mil contra 180 mil do ano passado). E ainda que a sensação geral a de que a festa foi um repeteco de sucesso se comparada a do ano anterior, a readequação entre ansiedade por grandeza e capacidade organizacional da edição deste ano talvez seja uma tímida pista de que o futuro do EDM como carro chefe da música eletrônica aqui no Brasil possa não ser tão longevo quanto imaginávamos.

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Mas essa análise mais materialista do evento dá indícios que são apenas sutis. Ainda assim é inegável a força simbólica que tem uma morte dentro de um festival. E, esteja ela ligada diretamente ao uso de drogas ou não, é impossível não ficar com uma pulga atrás da orelha. Durante o festival, nossa equipe teve a impressão de que, sim, o público no geral estava visivelmente mais doidaço do que ano passado, e, inclusive, testemunhei a venda aberta de drogas no meio da galera. Se levarmos em consideração também outros três atendimentos de ataque cardíaco, não podemos deixar de pensar que alguma engrenagem (provavelmente a da prevenção do uso excessivo de ilícitos e contenção de danos) dentro da complexa estrutura do festival está precisando de um talentinho para que a edição de 2017 consiga efetivamente fazer com que a complexa e rica cultura da música eletrônica seja a base do hino da Terra do Amanhã.

Me lembro que, não à toa, a organização do evento sequer esperou o final da edição de estreia do Tomorrowland Brasil em 2015 para anunciar as datas do festival para este ano. Nesta segunda modorrenta pós festival, não temos notícias das datas de 2017 (há edições confirmadas até 2020), ainda que a expectativa seja grande, pelo menos na internet e no grupo de WhatsApp do qual faço parte em que 256 pessoas acordaram no último domingo (24) se perguntando sobre a edição do ano que vem. Vamos esperar, dizem que um ano passa rápido.

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Veja mais fotos do festival, todas por Rodrigo Zaim/ R.U.A Foto Coletivo:

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