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Música

Por que a KL Produtora É o Produto de Exportação Mais Cobiçado do Brasil Segundo o MC 2K

O produtor paulista que toca nesta sexta (4) ao lado do português Branko no Boiler Room, fala como a gringa tem voltado olhos e ouvidos para a produção do funk nacional.
Isabela Talamini

Algumas semanas atrás, o produtor português Branko anunciou o lançamento do seu novo álbum, Atlas, em uma edição do Boiler Room, que rola nesta sexta (4), em São Paulo. No lineup do rolê estarão o MC Bin Laden e o MC 2k, além do VINÍ e dos manos do Marginal Men. O grande lance, porém, é que não é de agora que artistas da cena eletrônica daqui e de alhures mostram interesse nos funkeiros da KL Produtora. Após co-signs de gente como Bjork e Yung Lean, a música "Bololo Haha" do Bin Laden se espalhou por todos os cantos e pistas — de playlists da Rinse FM a sets do Skrillex. Por isso mesmo, ficamos curiosos pra saber se os moleques tinham alguma noção do que está acontecendo e, a real é que eles estão mais cientes que a gente.

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Ouça a Björk Discotecando um MC Brinquedo em Nova York

MC 2K (nome artístico de Kayque Martins) que estará ao lado de Branko nesta edição do Boiler Rooom é filho de Emerson Martins, o fundador da KL Produtora. Um dos primeiros MCs da rapaziada a fazer sucesso, 2K emplacou o funk putaria "Ziguiriguidum" em 2013 e agora, com apenas 22 anos de idade, ele é um dos principais cabeças da produtora. 2K, por exemplo, foi responsável por descobrir o MC Brinquedo, além de ajudar no conceito musical e visual dos outros nomes da produtora que despontam na cena funk paulistana. Num papo serião com Kayque, o funkeiro nos contou como é estar inserido nesse meio, como eles lidam com as dificuldades causadas pelo preconceito que ainda existe em relação ao gênero, sua origem periférica e como o Brinquedo é, sim, um gênio com plena noção do seu personagem. Saca só!

THUMP: Você acha que, com a repercussão das músicas da KL no meio eletrônico, há um reconhecimento maior pelo estilo musical que vocês fazem?
MC 2K: Com certeza. A rapaziada que está por trás dessa cena musical talvez tenha mais respeito hoje por nós do que o público normal. Acho que hoje o funk está atingindo um meio diferente e as pessoas normais não estão entendendo. Só quem trabalha no meio da música, de produção mesmo, que está lá dentro sabe a proporção que [o funk] está tomando. Pra gente estar envolvido num evento como o Boiler Room é porque o funk hoje ganhou sim um certo respeito. Fico muito contente em ver isso acontecer, séloko!?

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E sobre shows internacionais? Fiquei sabendo que vocês já estão recebendo algumas propostas. Você já saiu do Brasil pra fazer show antes?
Eu já fui três vezes ao Paraguai fazer show, "Ziriguidum" explodiu lá! Mas ir pra mim é um sonho a ser realizado. Ainda mais ir pra mostrar meu trabalho, sem palavras. Pra mim é uma satisfação imensa. Imagina, pra alguém como eu que cresceu em Minas Gerais, até esses tempos só sabia o que era vaca, galinha [risos]. Vai ser incrível ir pra fora, mostrar nossa cultura pra pessoas que a gente tem como referência."

A gente não aprendeu estudando, a gente aprendeu na rua.

E você acha que esse reconhecimento vai mudar alguma coisa pra vocês ou pro funk em geral?

Eu quero que o funk tome uma proporção mundial, eu fico imaginando nossa batida tocando em todos os lugares do mundo. Porque ritmos como o rap, por exemplo, são mundiais, todo mundo respeita e valoriza, eu espero que funk tenha essa evolução. Por mais que não seja com a gente, eu quero que algum dia tome essa proporção. Afinal, a batida é muito envolvente. Quero levar pra eles lá fora um pouco da nossa cultura daqui, a alegria que a gente tem ao sentir a batida do funk. No Rio de Janeiro, por exemplo, é normal gostar de funk, de crianças a idosos. Se um dia for assim em todos os lugares vai ser incrível e, se for com a gente então, melhor ainda!

Qual diferença você ainda sente entre o funk do Rio e o de São Paulo?

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O funk carioca foi o que deu o tempo, o ritmo e a batida [ao gênero]. Quando começamos a fazer funk em São Paulo, inovamos bastante, a ponto de ter nossas próprias características — que inclusive os cariocas não aceitam muito. Graças a Deus, hoje em dia isso tá mudando um pouco, estamos tendo uma boa aceitação no Brasil inteiro. No Rio, praticamente todas as músicas levam o mesmo som de tambor, aqui a gente tenta sempre diferenciar, usa sons de panela, de vento, boca, palmas. Eu acho que isso é o que fez a gente chamar a atenção das pessoas.

Leia: "Você Acha de Sabe, mas Não Faz Ideia: A Diferença do Funk Carioca e o Paulista

Você ainda se encaixa no gênero pago funk ou axé funk?

Quando eu surgi como MC, me lançaram como "o 2K da mistura de axé com funk", já que a música que explodiu foi "Ziriguidum". Eu não consegui dar sequência a isso, pretendo um dia conseguir novamente mas, minha proposta inicial era fazer funk putaria mesmo. Quando em São Paulo todos os MCs ainda faziam ostentação, eu era um dos únicos fazendo putaria. Me inspirei no funk carioca e contratei dois dançarinos. O que aconteceu foi que justamente a música que eu fiz misturando axé [e funk] foi a que explodiu. Hoje a minha música "Tá No Helipa", que graças a Deus deu certo, é um funk putaria — "desce sobe senta na pica, no baile do Helipa". Hoje, então, eu tô mais contente do que quando eu entrei. Acho que quando "Ziriguidum" fez sucesso, os contratantes e o público em geral ainda não respeitavam a KL Produtora como hoje respeitam hoje. Aquilo foi um início. Eu trouxe o Brinquedo pro escritório, ajudei na carreira do Bin Laden e juntos criamos o personagem do Pikachu. Fazer a KL forte acabou deixando todos os artistas mais fortes também.

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A KL cresceu muito de um ano pra cá mesmo, o Brinquedo virou uma celebridade da internet. Como foi lidar com essa fama? Vocês sentiram muito preconceito envolvido no interesse da mídia? Isso porque, me parece, que a grande mídia não estava interessada na música em si, só queriam fazer piadas.

Com certeza. Muitas vezes os jornalistas acham que estão falando com pessoas ignorantes. Acho que esse pessoal da mídia, talvez por terem estudado, se formado, ao ver um funkeiro ter reconhecimento ou acessos e um público fiel, ficam indignados. A visão que eles têm é que o funkeiro é um favelado, que começa a cantar funk pra poder ajudar a mãe e que não entende nada de música. Tudo bem, a maioria dos funkeiros realmente não entende de música quando começa, mas depois de uma boa assessoria, de um bom escritório, passa a entender sim. Eu mesmo vou falar que nunca fiz aula de canto, não sei ler notas musicais, mas sinceramente, o que eu faço não requer isso. Minha música não é cantada, é falada. Quando os caras nos entrevistam eles acham que a gente não vai conseguir nem responder as perguntas direito. Eu sei conversar sobre diversas coisas. Se alguém quiser falar comigo sobre comida, esportes, carros ou qualquer outro assunto eu vou saber conversar. A gente não aprendeu estudando, a gente aprendeu na rua. Esse é o nosso dialeto e isso não deveria nos desmerecer, mas muitas vezes as pessoas nos desmerecem por isso. Já teve repórter que fez uns tipos de pergunta que a gente só olhava pra cara dele e pensava "melhor fingir que a gente é idiota mesmo pra ver se pelo menos dá um pouco de repercussão depois".

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Tem gente que chega usando palavras que não estão no nosso dia a dia, mas se a pessoa usar um palavreado normal, nós podemos trocar ideia o quanto quiser. Mas sim, tem muito preconceito envolvido, ainda mais com a molecada.

Só que vocês já jogam com um lado mais humorístico também, né. Parece que vocês souberam reverter bem as piadas e o lado preconceituoso e conseguiram tornar isso o diferencial de vocês. O Brinquedo que ainda é novinho, sabe a diferença entre os fãs da música e os fãs da internet, dos memes?

Aconteceu automaticamente. O Brinquedo sabe diferenciar, sim. O negócio é que onde o Brinquedo chega, ele rouba a cena. Mas ele já tem isso claro na cabeça, que muita gente nem gosta do que ele faz — que é cantar funk — gosta apenas do personagem. Pelo cabelo, pela loucura, pelo "Meça suas palavras, parça!", pelo "Eu sou malandrão!", esses bordões que ele criou. O pessoal gosta da imagem. Tem, lógico, o público do funk que gosta mesmo das músicas, por ser envolvente. Mas, por exemplo, esses dias fomos a um evento do Youtube, um evento musical que todo mundo que tem bastante acesso no site é convidado. Quando chegamos todo mundo nos conhecia, mas o Brinquedo é quem rouba a cena. Você vê pessoas de outros estilos, esse pessoal mais alternativo, que parece gostar dele mais do que o público de funk. Eles veem o Brinquedo e nem acreditam. O Brinquedo tem bem claro na cabeça dele quem é fã da música e quem gosta do personagem.

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Eu além de MC sou também o empresário do Vinícius. Às vezes eu penso, pô olha só aquele moleque que eu peguei lá da Vila Natal e dei uma força pra ele entrar na produtora. Fiz ele abrir meus shows, pintamos o cabelo dele. Eu fico feliz. A música do Brinquedo já tem um tom de sátira e isso tudo acaba gerando interesse, inclusive de pessoas que nem gostam de funk. Abre uma exceção e às vezes acaba quebrando barreiras de preconceito também.

Leia: "13 Anos de Pura Malícia e Estilo: Entrevistamos o MC Brinquedo"

Vocês já chegaram a fazer shows pra esse público mais alternativo, né? Como foram essas experiências?

Sim, pro público de trap. A gente curte, viaja muito nessa batida. Hoje eu escuto mais isso do que funk. Eu não curto muito ficar só ouvindo o tipo de música que eu faço, porque dentro daquilo eu não vou ter referência. Preciso trazer novidades, ouvir o que tá lá fora. Eu gosto de trap porque é uma coisa que vem das produções de rap e, se conseguirmos fazer essa mistura, pode ser que seja bem aceito dos dois lados, do trap e do funk. Eu gosto muito das batidas do Tyga, do Young Thug, acho ele muito foda. Curto Diplo, a produção que ele fez pra nova da Madonna, o que é aquilo cara? A doSkrillex com o Bieber também, muito foda. Quando o Bin Laden tocou no Secreto, eu não tinha show e fui junto, queria ver qual era. Cara, o público é mais louco que o de funk! No show do Bin Laden todo mundo pulou o tempo todo. Quando ele chegou o pessoal perguntava sem parar "como foi trampar com o Diplo?". Se o público do funk recebesse a gente como o público do trap recebeu, acho que a gente seria tipo artista internacional porque, cara, a recepção que o Bin Laden teve lá me deixou besta! Foi um show muito legal de fazer. Se eu conseguir ter um pézinho dentro dessa cena vai ser maravilhoso, eu ia gostar muito.

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