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Música

Um Papo com o Daniel Limaverde, Um dos Escolhidos para o RBMA '14 em Tóquio

O novato produtor carioca que passará duas semanas na capital japonesa ao lado dos produtores brasileiros Pedro Zopelar e SILVA conta o que espera dessa edição do Red Bul Music Academy.

Quando meu editor me pediu para pesquisar sobre o Daniel Limaverde, um dos escolhidos para o Red Bull Music Academy desse ano que será sediado em Tóquio, eu falei: "quem?". "Eu também não sei", ele me falou logo em seguida, o que me deixou aliviado e logo surpreso.

Minha curiosidade pelos escolhidos para a edição desse ano já estava grande, e ficou maior ainda ao saber que dois dos meus favoritos iriam participar: o fashionista ex-underground Zebra Katz, que agora abraçou uma exposição mainstream com o Hervé e a Mad Decent; e o Mumdance, o mais instigante produtor do novo grime que acabou de se apresentar no Boiler Room ao lado do amigo Logos.

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Assim que vi o nome de Daniel Limaverde ao lado dos já conhecidos Pedro Zopelar, que já se apresentou em diversas casas do país e faz parte da D.Edge Agency, e o produtor capixaba Silva, que acaba de lançar seu segundo e elogiado álbum Vista Pro Mar e me falar no whatsapp que já está vendo animes para ir treinando o japonês. Assim que vi o nome de Daniel Limaverde ao lado dessas figuras conhecidas, já fui procurar mais sobre o carioca de 23 anos que possuía poucas e tímidas produções em sua página do Soundcloud e uma foto com a turma da Voodoohop em que incrivelmente todos estavam com bastante roupa.

Trocamos e-mails em que ele falou sobre música erudita estoniana, como começou a produzir e como está ansioso para o que irá acontecer daqui pra frente.

THUMP: E aí Daniel, me conta um pouco sobre você e o que mais você faz além de música?
Daniel Limaverde:Nasci em 1991, tenho 23 anos. Sou carioca, morei a vida toda no Rio, em Ipanema. Meus pais contam essa história de quando eu tinha acabado de nascer, e o Tom Jobim parou o seu carro depois de ver eles empurrando meu carrinho de bebê, fez um sinal de cortesia com o chapéu e deixou a gente atravessar a rua. Meu pai também é músico, o Ednardo, autor de músicas como "Pavão Mysteriozo".

Outra coisa que faço é cinema, dirigindo e escrevendo. Fiz um filme ano passado em São Paulo, e agora tenho alguns roteiros que espero filmar no ano que vem. Gosto tanto de filmar quanto fazer música, então meus planos são de lançar um videoclipe para cada música que lançar. Vou extender minha ida a Tóquio, e ao invés de ficar apenas durante as duas semanas referentes a minha participação no evento, ficarei mais três logo após acabar o RBMA, com a intenção de gravar material suficiente para o piloto de uma série de televisão sobre música eletrônica.

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E quando você começou a produzir?
Comecei a produzir há pouco tempo, uns dois anos. Acho que pra alguém que cresceu com computadores, fazer música com um parece algo óbvio. Eu relaciono muito o fato de ser safo e aprender produção musical sozinho ao meu antigo hábito de jogar videogames quando adolescente. Aprendi a fazer overclock em placa de vídeo pra rodar jogos mais pesados no PC, jogava MMORPG e programava bot, não tinha dinheiro pra comprar jogos originais, e baixava torrent, crack, jogava em servidor pirata… Esse tipo de atividade ilegal que uma criança está disposta a aprender a fim de não passar tédio.

Antes disso já tocava há um tempo. Como meu pai também é músico, foi uma coisa muito natural ter violões e pianos ao redor da casa, eram coisas com que eu também usava para brincar. Meu pai tinha um desses teclados workstation Yamaha, um desses modelos que tinham, além das teclas, uns pads, polifonia, backing tracks, etc… Tudo que era necessário pra criar arranjos. Eu vivia brincando com ele, soltava os beats/bases e ficava tocando qualquer coisa por cima.

Você toca como DJ também, ou só produção?
Nunca discotequei, mas quero muito começar e já estou praticando faz tempo. Minha intenção inicial quando comecei a fazer música era ter uma banda ou ser cantor/compositor como meu pai. Hoje em dia tenho vontade de discotecar, fazer instalações sonoras interativas, trilhas sonoras, improvisações ao vivo, produzir outros artistas… Tenho planos para cada um desses assuntos, basta arranjar as janelas.

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E o que você curte ouvir, e quais artistas te servem como inspiração?
Uma obsessão minha já há algum tempo tem sido o Arvo Pärt, compositor erudito estoniano. Ele é um cara que já compunha durante o regime da União Soviética, mas nessa época ainda fazia uma música densa, mais voltada pra elite intelectual do país. A parte interessante é quando depois de uma crise criativa de quase uma década sem compor, ele ressurge com um novo estilo chamado "tintinnabuli".

É uma música que quebra bastante com o conceito de temporalidade e dá lugar a algo mais poroso. Quem ouve precisa completar a obra ao invés de ser somente um espectador. Já coloquei várias pessoas pra ouvirem Arvo Pärt, e tem gente que fica em transe, tem gente que fica entediado, tem gente que fica triste, tem gente que fica tensa, tem gente que fica tranquila. Eu relaciono a experiência de ouvir Tabula Rasa com, por exemplo, a experiência de ouvir um set de house de um bom DJ numa pista de dança. Ambos são músicas que te permitem entrar em um lugar diferente e viver ali por um instante.

A gente vive uma espécie de ditadura da canção, que é um forma musical que costuma pegar o ouvinte pela mão e contar uma história, um filme. Várias das minhas músicas favoritas são canções, mas sou muito a favor de explorar novas formas musicais. Acho que The King of Limbs, do Radiohead, é um exemplo de disco que se aproxima dessa ideia de criar um ambiente, uma arquitetura em forma de música. O James Blake idem. Ultimamente também tenho ouvido muito Matthew Herbert, Nicolas Jaar, Theo Parrish, Charles Mingus e Cartola.

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Como rolou a oportunidade de participar da seleção pro RBMA?
O processo é o mesmo sempre, acho. Grava-se um CD com suas músicas e preenche-se um formulário com umas 50 perguntas, onde algumas são para lhe conhecer, outras você monta playlists de músicas, e algumas são um completo mindfuck, por exemplo, um Teste de Rorschach.

Se alguém quiser aplicar, eu recomendaria dar atenção ao questionário. Uma vez li essa ideia em um livro do Brian Eno, sobre o artista que trabalha não apenas sua obra, mas também a "moldura" que envolve essa com o que pode ser falado sobre ela, sobre sua história, sobre o zeitgeist, etc. Claro que isso não ajuda em caso que não se saiba fazer boa música.

Se eu não me engano, o Chico Dub é um dos que selecionaram os brasileiros aplicantes. Você já conhecia o trabalho dele com o Hy Brazil?
Oprimeiro show ao vivo de música eletrônica que assisti foi na primeira edição do Novas Frequências, festival que o Chico criou. Foi uma performance do Murcof. Gostei tanto que depois fui em todas as apresentações do festival naquele ano. Fui também em mais shows na segunda edição do Novas Frequências, mas não fui na última porque estava passando uma temporada em São Paulo.

Acho que o Hy Brazil é um mapeamento sensacional dos produtores daqui. Eu sou totalmente alienado com a cena de música eletrônica que a gente tem em volta, então descobri vários colegas. Fiquei muito abismado quando descobri o Paulo Dandrea, por exemplo. Não imaginei que havia gente fazendo esse tipo de música aqui.

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E você já acompanhava as outras edições do RBMA?
Acompanhei o Red Bull Music Academy desde do princípio que me interessei por produção e música eletrônica, mas como não me senti preparado pra tentar essa foi a única vez que enviei a inscrição. Virava noites assistindo as palestras que tem no site. Ano passado fiquei empolgadíssimo quando vi que seria em Tóquio, sempre quis conhecer o Japão porque durante a pré-adolescência eu acho que era meio otaku. Comprava uns mangás, via mais animes do que deveria e quando tinha uns 13 anos era fã da Utada Hikaru.

E o que você sabe ou conhece sobre os outros produtores que estão indo com você, o Silva e o Zopelar?
Já tive a oportunidade de conhecer pessoalmente o Lucio (SILVA), e ele é uma pessoa sensacional. Trocamos uma ideia e acho que pensamos parecido em muitas coisas.

O Pedro (Zopelar) por enquanto só conversei pela internet, mas já ficamos de nos conhecer assim que ele vier tocar no Rio!

Está ansioso para conhecer alguém específico que também está indo nesta edição?
Criaram um grupo só com os participantes no Facebook, mas não tive muito tempo e ouvi pouquíssimo do material dos outros participantes. Tem um cara de Londres que achei sensacional, Fred Gibson. Tem 21 anos e produziu o último CD do Brian Eno com o Karl Hyde.

Sinceramente, não há nada que não me deixe empolgado com o que vá acontecer daqui em diante.

Não deixe de acompanhar o que o Daniel fará por lá e além, pelas redes sociais:

facebook.com/pages/Daniel-Limaverde/147851098611862
soundcloud.com/danielimaverde