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Música

As Aventuras de Madeon

A pouca idade desse francês não condiz com seu currículo de gente grande.

Em uma tarde sombria e cinza, o artista batizado Hugo Pierre Leclercq adentra os arredores cobertos de carvalhos do hotel de Kensington bizarramente chamado Copthorne Tara, no centro de Londres. Com vinte anos de idade, cara de moço, ele é, tudo de uma vez, jovial, ereto, imediatamente polido e cortês. Ele se revela um charmoso e curioso camarada enquanto discute o entusiasmo em torno de seu álbum de estreia, Adventure, que será lançado em março pela Columbia Records.

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"Até agora, eu sempre achei que pudesse voltar atrás e mudar algumas coisas", ele confessa. "Quer dizer, ele já está no sistema do iTunes, então eu não posso, mas você sabe o que eu quero dizer. Eu tenho que me ater a ele agora. Eu preciso justificá-lo, explicá-lo, e esse é um passo bem grande."

A essa altura, você poderia pensar que o Madeon já estaria acostumado a dar grandes passos. Em 2010, quando tinha apenas 15 anos, ele se apresentou ao mundo com sua faixa de estreia "For You" e um remix vitorioso de "The Island" do Pendulum. Logo depois veio o set ao vivo de mash-up no YouTube apropriadamente intitulado "Pop Culture", que aglomerou 39 de seus discos preferidos (incluindo "Dare" do Gorillaz, "Wow" da Kylie Minogue e "Heavy Cross" do The Gossip) em um fluxo de adrenalina de três minutos e meio. Tentando emular o sentimento que teve enquanto um jovem fã de Daft Punk, o produtor adolescente mostrou sua habilidade inata em criar estruturas musicais através da fratura de samples. Ele também inadvertidamente fez o melhor disco de filter-house desde Alan Braxe e Fred Falke. O clipe teve 27 milhões de visualizações até agora.

"Pop Culture" calhou de acertar a blogosfera no momento exato em que o movimento EDM começou a conquistar os adolescentes de todo o mundo, que ficaram aliviados ao descobrir que nem todos os DJs eram homens de meia idade. Alguém de sua faixa etária também podia fazer isso. Não fez mal à credibilidade de Madeon o fato de que ele havia estabelecido amizade virtual com outros jovens produtores como Mat Zo e Porter Robinson. Com apenas um punhado de lançamentos, incluindo os singles "Icarus" e "The City", a faixa título do EP de três faixas, e mais alguns remixes de Yelle, Deadmau5 e do colega francês Martin Solvieg, Madeon se tornou um herói improvável da nova geração rave. Diminuto e com cara de criança, ele era o oposto do DJ superstar. Os fãs podiam se enxergar nele.

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Ele respondeu ao aparentemente interminável turbilhão de tweets e perguntas de Tumblr que seus fãs jogaram nele, mantendo sua acessibilidade e simpatia neste processo. Naturalmente, se tornou alvo de memes criados por fãs. Sua presença no lineup de festivais passou a causar o esgotamento dos ingressos e, já em 2013, Madeon estava produzindo discos para Lady Gaga e Ellie Goulding. Ano passado, ele produziu duas faixas do disco Ghost Stories, do Coldplay, e haviam rumores de que ele esteve em estúdio com a Madonna (No "Pop Culture" ele sampleou o hit dela "Hang Up").

No entanto, sua prematura consagração teve um preço. "Eu era um estudante caótico e relapso", Leclercq admite. "Eu praticamente repeti de propósito porque não queria ter qualquer outra escolha a não ser o êxito na música. De certa forma, eu me sabotei muito, mas foi necessário."

"No começo, esse desejo, esse objetivo claro que eu tinha, tornou as coisas mais difíceis," ele continua. "Mas quando [o sucesso] começou a acontecer, me senti muito livre. O mundo te diz que essas coisas não dão certo. Você quer ser um músico? Claro. Você quer ser um astronauta? Ahh, claro."

Assim como seus amigos Robinson e Zo, Madeon investe igualmente em como sua música é apresentada e em como ela é produzida. Da logística das campanhas de marketing e estratégias de gestão às nuances de suas apresentações ao vivo, ele é intensamente atento em resguardar tanto sua visão artística quanto o seu público.

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"Eu poderia ter virado uma celebridade de YouTube," Leclercq diz. "Eu não queria fazer a mesma coisa duas vezes, não queria ser um truque, não queria ser 'aquele cara'. É crucial se lembrar do que você quer ser, e de que decisões que você toma refletem isso."

Seu desejo de alcançar audiências maiores e mais amplas se reflete em sua profunda e respeitosa apreciação da música pop. "Eu sinto que a intenção da música pop é muito, muito bonita," Leclercq explica. "Algumas pessoas a enxergam como cínica, vendida, acham que ela tenta atingir todo mundo, como se isso não fosse arte. Música pop é um estudo puro de nós enquanto seres humanos. Ela tenta examinar o que é que une os seres humanos em um nível bem essencial. Acontece que a coisa com a qual todos nós nos relacionamos é a experiência humana. É lindo. Um hit que funciona para milhões de pessoas é uma coisa maravilhosa, é uma coisa inclusiva."

Apesar da posição incomum do Madeon, de ser ao mesmo tempo um produto e um criador do zeitgeist da música de pista desta década, ele resiste a aceitar a música eletrônica como parte de um contexto social maior. "Quando eu comecei, a música de pista era tida como vergonhosa ou ao menos não cool", diz Leclercq . "Tenho certeza de que existem muitas análises socioeconômicas que podem ser feitas para explicar seu surto de popularidade, mas às vezes essas coisas acontecem organicamente. Vamos apenas ser gratos por isso ter acontecido. Esse tipo de música de pista parece que apenas… apareceu. Pessoas como Skrillex surgiram e tudo mudou. Apesar de que eu tenho certeza que você pode achar uma linha do tempo de discos de sucesso se tornando cada vez mais eletrônicos. Tenho certeza que dá pra aplicar uma lógica externa a isso."

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"Quer saber", ele pausa e postula, em voz alta, uma exposição quintessencialmente madeoniana que se refere tanto a Stephen Hawking e Neil deGrasse Tyson quanto a Tintin ou ao Pequeno Príncipe. "Eu queria que nós tivéssemos controle sobre o universo e acesso aos parâmetros que nos permitem viver em mundos paralelos, onde pudéssemos acessar coisas como essas. Seria ótimo. Pode ser pertinente, essa ideia de juntar música a questões mais amplas na sociedade… mas não vamos pensar demais."

O sentimento de maravilhamento de Madeon flui por meio das veias de Adventure. Salpicado de estrelas convidadas como Dan Smith, do Bastille, e Mark Foster, do Foster the People, o álbum é inequivocadamente a afirmação de um jovem produtor feita com sua própria voz, um produtor que pretende transcender tendências ao mesmo tempo que mantém um ouvido no chão. "Funcionou em dois eixos", ele explica. "Eu estava pensando em por que fazer um disco é importante e concluí que isso é um perfeito encapsulamento de um período no tempo. Gosto e sensibilidade entram e saem da nossa percepção. Discos permitem que nós compartimentemos isso, e a pessoa que você era então vive para sempre dentro dele. Estou mudando enquanto músico e eu queria seguir caminhos diferentes, então eu queria cristalizar quem eu fui durante um tempo."

"A segunda parte é um pouco mais conceitual", Leclercq continua. "Eu tive uma imagem visual na minha cabeça de um empolgante sentimento social, e queria esse tipo de sentimento festivo refletido na música antes de partir para uma espécie de peregrinação no deserto, que também é refletida nas canções. É como estar em uma festa com amigos e então ir pra casa e tudo estar tranquilo. Esse contraste é muito poderoso."

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Apesar de Madeon defender o trabalho de seus primeiros amores musicais - uma combinação única de Daft Punk, The Beatles e Wolfgang Gartner (o último apresentado a ele pelo Robinson) - a influência desses artistas não se mostra de forma óbvia no trabalho dele. Em vários aspectos, esses artistas servem muito mais como inspirações conceituais do que qualquer outra coisa.

"Quando comecei a fazer música, estava tão impressionado com a amplitude e a profundidade dela, com suas possibilidades criativas, com ela me permitir expressar sentimento genuíno e com a maneira como ela combina a liberdade artística com um limite científico, técnico", Leclercq desabafa. "Eu senti como aquilo era amplo, lindo e fascinante, e percebi que era no que eu tinha que me focar."

Embora ele seja enfático em dizer que é "um tanto afastado" da cena de música de pista (ele ainda vive em sua cidade natal de Nantes, na França, longe da agitação da indústria musical de Paris, Londres, Berlin ou Los Angeles), Madeon é um ávido observador da tempestade na qual ele está pronto para se arremessar, embora com a perspectiva de alguém que está do lado de fora. Através desta lente, ele enxerga este momento no tempo como essencial.

"A coisa mais significativa que aconteceu com a música de pista não é o fato de ela ter se tornado grande, porque isso não dura para sempre", diz Leclercq. "É o fato de ela ter irrompido e se tornado parte da cultura. Isso é eterno. Ela vai estar sempre lá . Não precisa ser a maior coisa que existe, mas agora ela é compreendida por todos. Antes muita gente teria repulsa do bate estaca quatro por quatro, mas agora ele é livre de estigmas."

Como quem entoa uma profecia ou um decreto real ele acrescenta: "Esse sentimento vai durar."

Adventure será lançado em 30 de Março pela Columbia Records.

O novinho Madeon está sensacional:
soundcloud.com/madeon
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twitter.com/madeon