Nos Matriculamos na Escola que Ensina Música Eletrônica de Vanguarda para Crianças
School of Noise

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Tecnologia

Nos Matriculamos na Escola que Ensina Música Eletrônica de Vanguarda para Crianças

Desde setembro de 2014, a School of Noise, em Londres, introduz pré-adolescentes a obra de John Cage e outras piroses.

Em algum lugar, numa sala em East London, em Londres, a gritaria animada das crianças compete com os berros e gemidos de osciladores e filtros analógicos. Além de uma mesa cheia de moduladores, gravadores de rolo e uma bateria eletrônica que parece saída do foguete Saturno V, um homem barbudo de voz gentil está explicando a um grupo de crianças do ensino fundamental como funciona um Roland Space Echo.

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"E depois podemos fazer uma música?", uma das meninas pergunta irrepreensivelmente. "E vamos ser famosos?"

"Bem…", o homem, um pouco hesitante, começa a concordar. Mas logo a pergunta é esquecida na emoção de experimentar com sons estranhos e aparelhos arcaicos.

São sintetizadores, toca-discos, uma cracklebox caseira, o que parece ser - e de fato é - um transmissor de código Morse, presumivelmente resgatado de um velho escritório de telégrafo, agora usado como gerador de sinal no começo de uma cadeia de efeitos eletrônicos. "Fiz um SOS!", um garoto orgulhosamente declara, seus pontos e traços imediatamente transformados em blips e ups por um monte de pedais de guitarra.

Leia: A loja de sintetizadores mais obscura de Los Angeles

Seja bem-vindo à School of Noise. Desde setembro de 2014, este estabelecimento de ensino incomum introduz pré-adolescentes ao mundo da música eletrônica de vanguarda. Conversei com dois dos fundadores, os irmãos Jacob e Dan Mayfield, sobre como tudo aconteceu.

"Nos últimos dois anos, fiz vários workshops com crianças em festivais", Dan explica durante o almoço, após o final de uma sessão. "Eu fazia coisas como montar toca-discos de papelão, ou instalações de gravação binaural, às vezes. Tem muita coisa para fazer com sons. Sempre tive uma resposta muito boa de pessoas que gostavam de verdade desses jeitos diferentes e ligeiramente alternativos de entender o som. Então eu queria dar um jeito de reunir tudo isso. Foi daí que veio a ideia para a School of Noise."

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Os toca-discos de papelão de Dan, montados em minutos, em lugares como o End of the Road e o Green Man Festival, no verão de 2013, são um pequeno prodígio, aparentemente feitos de nada além de uma folha de papel pardo dobrada e presa por uma joaninha. Podem soar meio instáveis quando você gira o disco com as mãos, mas o fato de algo tão barato e simples ser capaz de produzir uma música reconhecível tem o poder de desmistificar imediatamente todo o processo de produção de som.

Este é um dos seus objetivos principais. Como explica o irmão de Dan, Jacob: "Queremos fugir da seriedade da música experimental. Minha graduação foi em música eletrônica experimental e esse é um ambiente cultural muito sério. Só queríamos trazer alguma diversão para a colaboração e exploração dos sons. Para que as pessoas se divirtam e se sintam bem com a música eletrônica."

Enquanto Jacob estudava eletrônica, Dan se dedicava à ecologia acústica, o estudo da relação das coisas vivas com as paisagens sonoras que as cercam. Foi uma disciplina que chamou a sua atenção para a ideia de que 'todos os sons comunicam alguma coisa." Ele me conta uma experiência epifânica que teve aos 19 anos, quando ouviu pela primeira vez a composição silenciosa de Cage, 4'33", e subitamente se perguntou, "e se apenas ouvimos uma música e ela começa quando nascemos e termina quando morremos?"

Todos os sons comunicam alguma coisa

Uma questão desse tipo soaria desconcertantemente pretensiosa vinda de qualquer outra pessoa, mas os irmãos Mayfield têm uma atitude tão aberta e simples em relação à música que é impossível não ser seduzido por ela. É uma abordagem, suspeito, que vem das suas origens na música folclórica. Dan, em particular, foi de tocar violino para grupos de dançarinos de Morris [uma dança folclórica inglesa] a trabalhar como músico de sessão para gente como Darren Hayman, Withered Hand e The Wave Pictures.

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A inspiração específica para a School of Noise, no entanto, veio de um filme do arquivo da BBC que se tornou um hit improvável no YouTube. "A certa altura, no ano passado", explica Dan, "um amigo meu, David Sheperd, da banda Ellis Island Sound, postou este vídeo sobre a Shoreditch Experimental Music School. Vi isso e pensei, isto é fantástico!"

O vídeo, que desde então já apareceu em blogs como Dangerous Minds, Synthtopia e Boing Boing, mostra o compositor Brian Dennis conduzindo, em 1969, uma turma de alunos da Shoreditch School - uma moderna escola secundária, hoje absorvida pelo extenso campus da Hackney Community College - em uma performance de "imagem sonora, baseada em ideias associadas ao calor", composta pelos próprios alunos.

A natureza impressionista e semimprovisada da composição tem um frescor e uma contemporaneidade que as minhas lições de música na escola jamais tiveram. É típico de Dennis, ex-membro da revolucionária Scratch Orchestra, de Cornelius Cardew, e parte da onda de pensadores pedagógicos que trouxeram novas abordagens para a educação musical nos anos 60 e 70.

Depois de assistir ao vídeo, Mayfield saiu e comprou no eBay, por uma quantia considerável, dois livros há muito esgotados de Dennis, Experimental Music in Schools e Projects in Sound, e descobriu nos dois volumes uma fonte preciosa de ideias interessantes e abordagens inovadoras. "É só um jeito muito criativo de fazer as crianças brincarem com música experimental", ele me diz. "Gostei do que ele fez porque descartou a linguagem complexa e tornou o assunto acessível para uma criança de oito anos. Pegamos algumas dessas ideias e tentamos incluir equipamentos e estilos contemporâneos também." Então, além de gravadores de rolo e moduladores em anel, na School of Noise você também encontra coisas como o kit LittleBits, da Korg, o prático e fascinantemente versátil sintetizador Ototo, da Dentaku, e o pacote de software open-source Sonic Pi.

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Mas, apesar de toda a sua alta tecnologia e arte sofisticada, o que é mais fascinante na School of Noise - de maneira muito similar à Scratch Orchestra que Brian Dennis integrava nos anos 60 e 70 - é que ela trata o avant-garde como uma verdadeira tradição popular. Como Jacob Mayfield enfatizou, é sobre "raízes", "colaboração" e "diversão". Se ao longo do caminho algumas das crianças se sentirem encorajadas a abrir suas mentes e a sua imaginação e talvez até mesmo criar algo extraordinário para si mesmas, tanto melhor.

Mais tarde, as crianças vão aprender como fazer peças gráficas, como John Cage e Cornelius Cardew, para construir uma estrutura a partir do caos de tons senoidais e sonoridades flutuantes. "Não tem um jeito errado de fazer isto", Dan os lembra. "Podem ser tão criativos quanto quiserem." Então as crianças se ocupam com canetas hidrográficas e adesivos coloridos, traçando mudanças no tempo e nas modulações de timbre dos seus respectivos aparelhos. Ao final, tudo ainda soa muito caótico - mas é um começo.

Os próximos workshops vão explorar coisas como criar efeitos sonoros para filmes, ilusões psicoacústicas, imagens com pratos de Chladni e, no dia 6 de junho, as crianças vão mostrar o que aprenderam na Union Chapel, em Islington, em um show ao vivo ao lado da maga do teremim e compositora de cinema Sarah Angliss. "É uma jornada muito divertida que eu acho que apenas começamos", me diz Dan. "Tem tanta coisa que você pode fazer. Se pudermos instilar um pouco de curiosidade…"

Clique aqui para mais informações sobre a School of Noise

Tradução: Fernanda Botta